Dica de Documentário

Capitalismo: Uma História de Amor
2010
Direção: Michael Moore


Falar mal do capitalismo virou lugar-comum, indiscutivelmente. Não que o sistema não mereça críticas, é que elas, geralmente, veem embaladas em tanto radicalismo e superficialidade quanto os elogios de seus mais ferrenhos admiradores. Ficamos então na escolha do "menos ruim", do argumento "menos viciado". Michael Moore, conhecido por suas produções sempre provocativas, tenta aqui lançar um olhar um pouco mais equilibrado sobre o tema, partindo do pressuposto do que causou a crise financeira de 2008.

Uma das várias críticas (bem colocadas) se referem ao mercado de hipotecas financiado por grandes bancos, como o CITIBANK, e que resultam, muitas vezes, na desapropriação da casa pelos donos. Algo realmente escandaloso, e que o documentarista explora de maneira eficaz, mostrando os meandros desse tipo de sistema, onde os grandes conglomerados financeiros sempre saem ganhando. As filmagens, com diversas famílias sendo desalojadas, são muito eficientes, e evitam o melodrama. Mostram apenas pessoas revoltadas com um verdadeiro roubo que sofreram.




O documentário também explora assuntos interessantes, sobre as características básicas do Capitalismo, inclusive, com a falácia de que todos, sem distinção, podem ser ricos. Isso, claro, é mostrado como o que é, de fato: um sonho, uma ilusão vendida nas propagandas. O lugar cada um, na verdade, já está, pré-estabelecido, como em castas sociais. A falta desse "sucesso capitalista" gera, na verdade, frustração, e, por isso, muitos tentam outros caminhos, seja através das já faladas hipotecas, seja através da criminalidade.

Outro aspecto muito bem conduzido pelo documentário é a relação das empresas com seus funcionários, desde o direito à greves e reivindicações, passando por demissões em massa, quando o prometido pelo "sonho capitalista" foi justamente o contrário. Um caso específico dá conta de apólices de seguro sem o conhecimento dos empregados, e quando estes morrem, é a empresa que lucra, ficando com o dinheiro do seguro. Um escândalo assombroso, e que envolveu, na época, instituições como a American Express e a Hershey's.




Claro que o lado político também iria entrar na ácida produção de Moore, mostrando, entre outros absurdos, gerentes da Bolsa de Valores infiltrados diretamente na política, um, inclusive, sendo Ministro do Tesouro Nacional. Conveniente, não? É daí que surge a proposta da tão divulgada "ajuda" aos bancos norte-americanos na quantia inacreditável de 700 bilhões de dólares. É impagável, por sinal, a sequência em que o cineasta vai de banco em banco com uma sacola tentando "reaver" o dinheiro do contribuinte. Sarcasmo puro.

Mas, também o documentário peca em algumas coisas um tanto forçadas, um tanto maniqueístas. Música dramática para pontuar o drama de algumas pessoas é, honestamente, desnecessário, pois os acontecimentos, por si, são absurdos, e não careciam de tal artifício. Quando a produção cita a vitória de Barack Obama à presidência dos EUA, esse subterfúgio também é usado, e, mais uma vez, sem necessidade. São coisas que se não acabam diluindo a crítica que Moore quer passar, pouco contribuem para que entendamos a complexidade do sistema.



Felizmente, o tempo, em outros aspectos, parece ter feito bem ao diretor. Ele está menos presente na frente da câmera, o que dilui aquela sensação de egocentrismo nas suas produções anteriores. Também está mais irônico, e até mais sutil, utilizando, algumas vezes, do humor para passar a sua mensagem. Isso, com certeza, acaba deixando a narrativa mais fluida, sem pesar tanto a mão. E, os especialistas que ele entrevista, realmente, lançam uma boa luz num assunto, aparentemente, batido e sem grandes novidades.

No desfecho, Michael Moore faz um pedido: "Não posso fazer nada sozinho. Juntem-se a mim". E, de fato, ele não está sozinho. Isso é muito bem pontuado nas "alternativas" mostradas na parte final do documentário, onde, por exemplo, empregados demitidos de uma empresa, unem-se e formam uma cooperativa, na qual todos têm fez e voz. O Capitalismo, enfim, vai continuar fazendo parte de nossas vidas, ativamente. Mas, isso não significa que devamos nos calar diante de seus (inúmeros) erros. Moore, um provocador nato, que o diga.


Nota: 8/10 

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