Filme Mais ou Menos Recomendável
A Autópsia
2016
Direção: André Øvredal
INUSITADO FILME DE TERROR COMEÇA MUITO BEM, MAS, PERDE-SE EM SUAS PRETENSÕES DE METER MEDO NO ESPECTADOR
Às vezes, algo escapa de ser excelente por pequenos detalhes. Ou seja, não é necessário muita coisa. Basta tentar fazer diferente, sem tantos convencionalismos. O cinema de terror, por exemplo, padece muito desse mal. Tudo bem que nesse tipo de filme pouco é exigido do roteiro, das atuações, e de outros atributos, cabendo, pelo menos, a capacidade de meter medo no espectador. E, convenhamos: qual produção faz isso ultimamente? Nenhuma.
Eis que "A Autópsia" tinha tudo para cumprir essa tarefa, até mesmo porque a direção meticulosa de André Øvredal (bem melhor do que a de Shyamalan no recente e incensado "Fragmentado") constrói um clima, de fato, apavorante aqui. Porém, o roteiro esquemático e cheio de clichês estraga tudo, infelizmente.
E, até que "A Autópsia" começa bem, dando a impressão de que vai por um caminho, pelo menos, um pouco mais diferenciado do que o normal. De início, uma câmera contemplativa, mostrando os arredores de uma bela casa, e, ao passo que vamos olhando mais perto, percebemos algo de errado. É então que adentramos nosso olhar na residência, onde ocorreu uma terrível chacina, sem explicação alguma. A sensação lembra um pouco a sequência inicial de "Seven", quando os policiais encontram a primeira vítima daquele serial killer.
A partir daí, já pensamos que uma história interessante pode surgir daí. Eis que, no porão da casa, está semi-enterrada uma garota, que, imediatamente, é levada para uma autópsia, a cargo de Tommy Tilden, que, ao lado do seu filho, Austin, comanda um necrotério na pequena cidade onde vivem.
E, essa parte da autópsia, em si, é deveras bem feita, não sendo necessariamente tão gore como poderia ser, mas, incomodando na medida certa. Ao mesmo tempo, pelo menos, de início, vemos que Tommy e Austin são dois personagens muito bons, inteligentes, falando coisas acertadas, e tentando de uma maneira profissional descobrir o que aconteceu à garota. Não é preciso muito tempo para que simpatizemos com eles, nem é necessário que saibamos muito sobre a sua profissão para entendermos o que estão fazendo e porquê. Emergimos facilmente na história.
O problema surge quando algo muito pavoroso é encontrado no corpo da garota, e o terror, enfim, começa. Aí, o caldo entorna, pois, Tommy e Austin que, antes, mostravam-se pessoas sensatas e equilibradas, agora, passam a cometer todo tipo de besteira, colocando a vida deles em risco através de atitudes muito bobas, E, haja furos no roteiro.
Agora, verdade seja dita: nesses momentos em que o terror dá as caras no filme, o clima que é gerado realmente mete medo, e algumas cenas dão um autêntico frio na espinha. Porém, com as atitudes cada vez mais infantis dos protagonistas, tanto pavor se desfaz no ar. E, tantas falhas se devem basicamente ao roteiro de Richard Naing e Ian B. Goldberg (os mesmos que escreveram a história do próxima "Sexta-Feira 13"). Quando as explicações para os estranhos fenômenos daquela autópsia vão aparecendo, a verossimilhança vai sendo deixada de lado.
Não que fantasiar demais num filme de terror seja ruim. É preciso que haja uma boa justificativa para os acontecimentos que pretendem deixar o público apavorado. Mas, não há. Pra se ter uma ideia clara disso, num determinado momento, Tommy começa a desvendar alguns dos mistérios "do nada", como se ele estivesse lendo o roteiro naquele instante. Fica demasiadamente forçado.
A direção do estreante André Øvredal até que consegue tirar algum leite de pedra aqui, muito por conta de sua inventividade em nos ambientar aos mínimos espaços, fazendo com a gente se sinta dentro da ação.
Outro ponto um pouco positivo são as atuações, em especial, as de Brian Cox e Emile Hirsch, que conseguem dar carisma aos seus personagens, mesmo quando eles cometem burrices inacreditáveis em determinados momentos. Há também Olwen Catherine Kelly, que, mesmo sem dizer uma palavra, e interpretando uma pessoa morta (!) consegue passar uma sensação de medo constante, como se alguma coisa fosse acontecer a qualquer momento.
A parte técnica também se destaca positivamente, principalmente, na maquiagem, conseguindo mostrar uma autópsia de maneira incomodamente natural.
"A Autópsia" prova o quanto está difícil do cinema estadunidense atual fazer um bom filme de terror que seja. Quando tudo parece que vai dar certo, acontece o oposto, a acabada dando tudo errado. Algo que começa bem, instigante, sutilmente amedrontador, ao final, escolhe o caminho mais fácil por pura falta de ousadia.
Só que não chega a ser um filme necessariamente ruim, mas, são tantas possibilidades jogadas fora, que não deixa de ser frustrante constatar que o que poderia ser marcante, devido a uma certa covardia dos seus realizadores, acomoda-se numa produção meia boca, facilmente esquecível. Uma pena que os realizadores de filmes de terror de hoje tenham, ironicamente, tanto medo de nos fazer ter medo.
Literalmente, apavorante.
NOTA: 5,5/10
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