dica de filme ("Nós Somos as Melhores")

Dica de Filme

Nós Somos as Melhores
2013
Direção: Lukas Moodysson


Divertido e "descompromissado" filme do diretor de "Para Sempre Lylia" é uma produção empoderadora sobre três jovens que não se adaptam ao sistema

Filmes podem ser analisados de diversas formas. Uma das mais interessantes é entender a intenção da obra no decorrer dela, quando, a princípio, pensávamos se tratar de uma história completamente diferente daquele que se iniciou. Ou seja, tem aquelas produções que nos "enganam", digamos assim. Parecem que vão por um caminho, mas, não são necessários mais do que alguns minutos para perceber que certos filmes, na verdade, vão por outro viés, mesmo que não abandonem a sua premissa original (nem a sua essência). 

Nós Somos as Melhores, do diretor sueco Lukas Moodysson, segue por esse caminho, e, assim como ótimas produções estreladas por crianças e/ou adolescentes nos últimos anos (não tem como não citar o cativante Pequena Miss Sunshine), ele também consegue ir além do que apenas mostrar o dias a dia de personagens que ainda não chegaram à vida adulta e que enfrentam suas próprias  (e peculiares) dificuldades.




Uma das coisas que mais chamam a atenção neste filme é a forma quase documental com que Moodysson usa sua câmera, quase como se estivéssemos naqueles ambientes ali, participando ativamente daqueles acontecimentos. Por sinal, acompanhar a vida de Bobo e Klara, duas garotas inteligentíssimas, e que não se enquadram nem um pouco nos ambientes em que frequentam, é delicioso, engraçado, triste e cativante. 

Ambas, de forma bastante espontânea, possuem um carisma que nos deixa interessados a respeito do que irá acontecer a cada instante do filme. E, quando uma terceira personagem se junta a elas, Hedvig, a história ganha ainda mais força. Quando essa nova amiga aparece, ela se torna uma possibilidade de amadurecimento em certas questões para Bobo e Klara (principalmente para esta última).

Inclusive, o filme, pelas palavras das protagonistas, é provocação em cima de provocação. Há alfinetas, por exemplo, à religião, ao consumismo, à futilidade atual dos jovens, à ignorância dos adultos, etc. E, o melhor: nada panfletário, caricato ou superficial, com tudo sendo dito de maneira bem natural por crianças que, mesmo inocentes, já possuem uma visão de mundo bem além dos outros ao seu redor. 

Porém, não pensem que o filme seja chato, ou coisa do tipo. 

Muito pelo contrário. 

Algumas passagens são divertidíssimas, com situações típicas da pré-adolescência, e é esse outro ponto forte do filme: mesmo plantando uma semente de muita consciência na trama, ele não se esquece de que estamos vendo o dia a dia de jovens que mal saíram da infância, e que, sim, cometem, às vezes, atos inconsequentes, e que ainda se comportam como crianças. Nada pesado ou carregado, portanto. Apenas a esperteza de saber como contar esse enredo através desses tipos de personagens.




Como se não bastasse, o filme ainda tem uma musicalidade muito forte, calcada basicamente no punk, evidentemente. O melhor é que esse "jeito punk" não está somente inerente à música em si, mas, à atitude das garotas, que sempre se comportam da maneira que acham que devem, dando, muitas vezes, um "foda-se" para a sociedade estúpida que teima em censurá-las. 

E, cada uma é punk à sua maneira; de Bobo, com seu jeito introspectivo, mas, bastante lúcido, a Klara, e suas explosões que, apesar de algumas vezes acabar exagerando na dose, quase sempre fala coisas bem acertadas para alguém da sua idade. Uma das sequências finais da produção evidenciam ainda mais essa forma aguerrida e empoderada com que as meninas agem diante desse mundo, no mínimo, patético.

Por ter esse tom meio documental, um dos grandes destaques da produção são as atuações. E, realmente o trio de atrizes (Mira Grosin, Mira Barkhammar e Liv LeMoyne) está muito bem, mostrando uma desenvoltura de gente grande, agindo de maneira sorridente e descontraída quando é necessário, e atuando de forma mais sutil e discreta quando a situação exige. O próprio Moodysson conduz tudo com mão muito leve, fazendo o tempo da produção passar muito rápido. 

O roteiro (também do cineasta) é muito esperto ao parecer que vai mirar num alvo, e acertar em outro, sem nunca ser truncado. Tudo na história se encaixa perfeitamente bem, sem nada parecer forçado. E, claro, a trilha sonora é bastante interessante dentro desse contexto, com citações a alguns artistas da época (alguns, obscuros e outros, nem tanto), principalmente, da cena punk.





No final, o que temos é um filme que, de maneira "descompromissada", expõe a essência do punk não somente na questão da música, mas, também na atitude. 

E, mais do que pertinente para os dias atuais: na atitude de meninas que simplesmente não se adequam ao status quo, e que não corroboram com a hipocrisia, nem com o falso moralismo que presenciam, seja dos seus próprios pais, ou até mesmo daquela banda punk que elas idolatravam, mas, que não se mostra, pessoalmente, como imaginavam. 

Um filme, em suma, que vai além do que a premissa parecia querer insinuar, e que mostra questões bem mais complexas e profundas do que e poderia imaginar (mas, sem perder a alegria, e, muito menos, o estilo, ou - mais ainda - os princípios).

Isso, sim, é muito PUNK!

Yeah!


NOTA: 8,5/10


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