DICA DE FILME ("SINAIS DE VIDA")

Dica de Filme

Título: Sinais de Vida
Ano de lançamento: 1968
Direção: 
Werner Herzog



A "utilidade" da guerra e a "inutilidade" do homem

Herzog sempre foi um cineasta preocupado com o ser humano, mais precisamente nos limites que separam a racionalidade da insanidade perante situações das mais incômodas. De O Enigma de Kaspar Hausen a Cobra Verde é assim. 

Os personagens em seus filmes perdem gradativamente o controle de quem são devido a fatores externos brutais, e na impossibilidade de viver sua essência em um mundo tão desgraçado, eles fogem, isolam-se e revoltam-se. 

Ou se tornam "inúteis".  

É o que acontece com o soldado alemão Stroszek, que passa a ficar locado dentro de um forte numa ilha na Grécia após sofrer um acidente de guerra. Seus superiores acham por bem que ele passe seu tempo no local, recuperando-se dos traumas físicos que sofreu. Porém, os traumas psicológicos permanecem. 

E são esses aspectos que colocarão a sanidade do homem à prova, diante da perspectiva de ser uma pessoa "inútil", que não tem mais "serventia" para o seu país. 



Algo a se impressionar aqui: este é somente o primeiro longa-metragem de Herzog, que ele realizou quando tinha apenas 19 anos de idade. Porém, sua visão cinematográfica já era de gente experiente, preocupada em passar uma mensagem, ao mesmo tempo que estava ciente de como manipular as técnicas da sétima arte. 

Às vezes, ele mostra imagens com câmera na mão, como se fosse para mostrar o tumulto mental de Stroszek. Em outros momentos, o olhar do cineasta contempla a paisagem, mostrando a desolação dos que se encontram confinados no forte. É uma narrativa que ora se mostra ágil, ora impõe a reflexão. 

Os personagens que circundam Stroszek, em maior ou menor grau, encontram-se na mesma situação que ele: confinados, jogados num forte numa ilha qualquer para fazerem trabalhos banais, do dia a dia. Só que eles acabaram de sair de uma guerra. Mas, a guerra continua neles. 

E, isso podemos observar em diversos momentos, quando eles tentam buscar ânimo, entusiasmo, em tarefas simplórias, muitas delas sem grande sentido. Apenas fazem isso para se sentirem, de alguma forma, "úteis" enquanto o tempo passa. Porém, não demora muito e eles percebem que a solidão será uma constante em suas vidas daqui pra frente. 



Nos moldes de boa parte dos seus melhores filmes, Herzog se mostra um questionador. Mesmo sem ser panfletário, ele é bastante contundente ao expor a crescente perturbação mental de Stroszek, que, segundo sua esposa (que ele conheceu e se casou na própria ilha), está cada vez mais melancólico, e começa um serviço com urgência, mas não consegue terminá-lo. 

A condição humana aqui é a de alguém que se sentia parte integrante de um sistema bem específico (o da guerra). Quando foi tirado abruptamente disso, foi perdendo aos poucos o sentido da vida, incapaz de conviver harmoniosamente consigo. 

São muitos traumas, e, ao mesmo tempo, a necessidade de sentir "útil" de alguma maneira. Só que os trabalhos banais do forte já não conseguem mais suprir essas necessidades. Resta ao homem apenas uma coisa: a revolta contra tudo aquilo.

Herzog filma com muita perspicácia, fazendo com que "entremos", de fato, naquele forte e acompanhemos de perto aquelas vidas banais. Com uma visão cheia de significados, o diretor consegue compor cenas belíssimas, como a dos fogos de artifício já na parte final, como se aquela cena representasse a alma liberta de Stroszek, que agora encontra certo "sentido". 




No final das contas, é isso o que Stroszek quer para a sua vida: algum significado. Porém, sua alma já está demasiadamente atormentada devido à guerra. Então, a única válvula de escape que possui são as explosões (internas e externas). 

E é incrível que este filme extremamente humano e anti-bélico tenha sido somente o primeiro longa-metragem de Herzog. Um talento nato, que se mostraria ainda mais forte nos seus filmes posteriores, mas que, aqui, já demonstrava a preocupação do cineasta com a inevitabilidade da desgraça do ser humano, e de sua clara "inutilidade" para coisas como a guerra. 


Nota: 8,5/10

Comentários

  1. Muito bom o texto! Vou procurar para assistir! Chamou atenção a fotografia do filme.

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  2. Esse filme é considerado um marco do novo cinema alemão da época. Inclusive, tem muito de Glauber Rocha em algumas cenas.

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