Dica de Filme ("Na Mira da Morte")
Dica de Filme
Título: Na Mira da Morte
Ano de lançamento: 1968
Direção: Peter Bogdanovich
Os símbolos de violência dos EUA e o medo da juventude moderna
As imagens que os EUA evocam são quase sempre de muita violência, mesmo que, ironicamente, isso contraste com a ideologia de liberdade e altruísmo que permeia o imaginário estadunidense ao longo de sua história. Por essa razão, é bem provocativo que em plena efervescência cultural dos anos 60, o ótimo cineasta Peter Bogdanovich tenha feito um filme (este "Na Mira da Morte") que traz à tona alguns dos principais elementos da culturais da terra do Tio Sam para questionar a postura de violência que é a base do país.
Ao mesmo tempo, bem no momento das mudanças de costumes dos jovens da época, Bogdanovich também traz uma certa desconfiança com essa juventude, afinal, ela ainda foi criada no seio de uma educação calcada em simbologia violenta. "Esse é o futuro da nação?", é quase como se o filme provocasse, como se aqueles arquétipos fossem inerentes ao país, não importando a geração.
Não é à toa, por exemplo, que uma das histórias do filme se concentra em Byron Orlok, um ator veterano de filmes de terror, que está prestes a se aposentar. Seus diálogos reforçam os questionamentos intrínsecos ao longa, como quando diz que precisa dar espaço para a juventude, e que o seu tempo já passou, ou mesmo quando fala que num mundo onde alguém entre num restaurante e mata a esmo, as pessoas já não têm mais medo dos monstros que ele interpretou em seus filmes.
Em paralelo, a outra história que "Na Mira da Morte" conta é do, aparentemente, pacato Bobby Thompson, um rapaz de família, casado, vivendo num seio cristão, mas, rodeado de armas. Inclusive, a facilidade com que ele compra armamentos pesados já impressiona desde aquela época, bem antes de Michael Moore fazer o seu "Tiros em Columbine". Nesse ambiente, o tédio e a ociosidade vão tomando conta de Bobby, que, em tese, não tinha nenhum motivo para surtar. Mas, o tempo mostra o contrário.
Mesmo que essas duas histórias pareçam distintas, em certos pontos, acabam tendo muito em comum, conversando entre si no que diz respeito a questionar o que os mais velhos estão deixando para a juventude, e o que esta está fazendo com toda a liberdade que está adquirindo. Ao mesmo tempo que as histórias de terror do veterano Byron Orlok parecem ultrapassadas, um novo horror vai se apossando dos EUA, como se a herança deixada para os mais jovens fosse algo que eles não conseguissem controlar, o que resta são apenas os símbolos puros da nação, que, isolados, provocam terror e tragédia (cultura da arma, da violência e do individualismo extremo).
Não é por acaso, que as primeiras vítimas de Bobby são justamente as pessoas de sua família, aquelas com que mantinha um vínculo íntimo, e que moldou sua personalidade. Em seguida, suas ações se concentram em atirar em carros em movimento, e num drive-in, novamente, símbolos da cultura estadunidense que representavam à época certo grau de modernidade. É quase como se Bobby, em sua sanha psicopata e assassina, rejeitasse tudo isso, talvez buscando certo propósito em uma vida vazia.
O filme também parece representar uma tentativa frustada de ruptura, de cisão temporal nos EUA do período, com o antes e o depois de 1968 e sua revolução cultural, numa provocação que mostra que, mesmo com todos os avanços, a "terra da liberdade" continuará a mesma; violenta, hipócrita e com uma juventude apática e a flor da pele. Praticamente uma visão pessimista do futuro da nação, mesmo que alguma ética seja mantida na figura de Byron Orlok, que se vê mais horrorizado do que as vítimas dos monstros de seus filmes.
"Na Mira da Morte" é, portanto, um filme de terror autêntico, pois, mostra que o horror pode surgir em qualquer lugar. E, quando esse lugar é permeado por símbolos de violência e sangue, não é preciso monstros, vampiros, espíritos ou qualquer outro ser sobrenatural. Basta um rapaz de família tradicional com a chance de fazer um massacre.
Nota: 8/10
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