DICA DE FILME ("Não Olhe para Cima")

Dica de Filme


Título: Não Olhe para Cima
Ano de lançamento: 2021
Direção: Adam McKay


Ótima sátira política veio no momento certo, ridicularizando a nossa sociedade negacionista, consumista e completamente alheia à realidade 

Há obras que conseguem ("infelizmente") ser atuais (até demais). Como é possível? Bem, há vários fatores envolvidos, dentre eles, o talento dos envolvidos ao captarem o "espírito do momento". Mas o "mérito" (digamos assim) é principalmente nosso. Afinal, estamos no ano de 2021, e tem uma parcela significativa de pessoas que ainda acreditam em bobagens, fake news e negacionismos diversos. 

Sim, é nossa culpa que filmes como "Dr. Fantástico", por exemplo, continuem tendo relevância além da arte, sendo não apenas uma sátira divertida de uma época, mas, uma radiografia precisa de uma sociedade medíocre. E, do jeito que as coisas andam, periga acontecer o mesmo com "Não Olhe para Cima", produção da Netflix, que é um retrato bastante mordaz dessa era de anti-ciência. 




É verdade que a narrativa do filme demora um pouco pra engrenar. São primeiros 30 minutos são meio morosos. Tudo que é compreensível que o roteiro quisesse passar a sensação de desalento e desconforto do dr. Randall Mindy e de sua assistente Kate Dibiasky ao tentarem informa à presidente dos EUA que um cometa está para colidir com a Terra daqui há 6 meses, extinguindo toda a vida daqui. 

Mas, são momentos em que o diretor Adam McKay pesa um pouco a mão. Falta um pouco de timing nesse início. Porém, com um pouco de paciência, tudo vai se encaixando e o filme engrena de vez, especialmente quando começa a fazer comentários muito bem bolados com a vida real da atualidade, desde o culto às celebridades instantâneas ao ódio gratuito na Internet, passando pela invasão de privacidade que as grandes corporações nos impõem. 

O bom é que o roteiro não precisa "parar" a história enquanto adiciona esses comentários sociais, inserindo tudo isso enquanto a narrativa avança. Há um claro e nada sutil paralelo com o mundo atual, onde não somente as autoridades, quanto a população média tem se rendido a mentiras e a duvidar da ciência da maneira mais tosca possível. E uma das qualidades do filme é apontar isso de maneira tão debochada e esdrúxula que incomoda todos os lados possíveis. 




O roteiro (e que foi escrito pelo próprio diretor do filme) apresenta críticas muito afiadas, e que não se limitam somente ao deboche e ao escárnio. Há uma preocupação clara aqui de informar o público, ao mesmo tempo em que ridiculariza os negacionistas. Em determinado momento, por exemplo, algumas pessoas chegam a dizer que um cometa em rota de colisão com a Terra pode ser bom para a geração de empregos (qualquer semelhança com a realidade... Enfim). 

Além disso, por mais que alguns personagens estejam tentando fazer o que acham eticamente correto, a história não os pinta como heróis imaculados, mostrando que são pessoas comuns, com defeitos, o que dá mais profundidade a eles (caso do dr. Randall). Ou seja, apesar de ser uma sátira, o filme consegue ser pé no chão, humanizando os personagens, ao mesmo tempo em que denuncia a ignorância do negacionismo. Em muitos momentos, rimos (mas, de nervosos). 

Completa tudo um elenco muito à vontade em seus papeis. DiCaprio faz muito bem o dr. Randall, com seu jeito controlado e (ao mesmo tempo) preocupado em convencer as pessoas dos fatos. Lawrence faz uma Kate que funciona como o lado mais emotivo de uma situação que, de fato, pode que as pessoas explodam de raiva em meio à tanta estupidez. Meryl Streep parece estar se divertindo mais do que em seus últimos trabalhos, o que é um deleite de ver. Ou seja, no geral, estão todos excelentes. 




"Não Olhe para Cima" é uma sátira? Sim! É uma comédia? Também (mas, a gente ri mais pela tensão). É um drama? Infelizmente. Às vezes, parece terror? Sem dúvida! É um filme que captou como poucos recentemente o espírito desse momento em que passamos por uma pandemia. Fala de negacionismo científico, das futilidades nas mídias sociais, das megacorporações mais preocupadas com lucro, dos políticos mais interessados em reeleição, etc. 

E consegue amarrar tudo isso de maneira divertida, criativa e até cruel. 

Será que daqui a 20 anos, ele será "apenas" um ótimo filme, ou continuará a ser "atual"?

Esperemos que não. Sejamos, ao menos, um pouco otimistas.


Nota: 8,5/10



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