DICA DE FILME ("A RELÍQUIA")
Dica de Filme
Título: A Relíquia
Ano de lançamento: 2020
Artista: Natalie Erika James
Terror familiar aborda a velhice de maneira metafórica e inquietante
Já não é novidade pra ninguém que a nova safra de terror está muita bem servida com produções interessantes, que usam de todo tipo de figura de linguagem para falar de temas mais comuns e corriqueiros (vide o ótimo Hereditário). Este A relíquia segue mais ou menos os mesmo rumos, só que com resultados diferentes (mas, ainda assim, com certo impacto).
O grande mérito é apostar no drama familiar tendo o terror não só como pano de fundo, mas, também como algo intrínseco aquele ambiente. Dessa forma, o que é macabro passa a ser qualquer atitude um pouco mais estranha dos personagens, que parecem movidos por alguma força ou entidade externa. Nisso, o drama acaba servindo para nos conectarmos aos personagens, para que nos identifiquemos com seus problemas e agruras. É um ótimo recurso, e que aqui vale a investida.
A diretora Natalie Erika James é sagaz ao saber trabalhar com a atmosfera de mistério que circunda a história. E isso ocorre especialmente em seu primeiro ato, quando uma senhora desaparece, e tanto a sua filha, quanto a sua neta (Kay e Sam), estão à sua procura. Esses momentos iniciais possuem um propósito bem claro: mostrar a relação entre estas personagens, e que é algo que vai se intensificar com o ressurgimento de Edna (a senhora desaparecida).
Mesmo que em um ou outro momento percebamos que há algo de macabro naquela casa, é na relação entre essas personagens que o filme ganha intensidade. Cada uma com sua personalidade distinta tentará lidar com aquela situação, seja Edna ficando cada vez mais debilitada e recusando a ajuda de suas parentes mais próximas, seja Sam em conflito com a mãe por não querer que a avó vá morar num asilo. São todos dramas e conflitos bem palpáveis que engradecem a trama.
Some-se a isso as interessantes e pertinentes metáforas que a trama propõe, quando, por exemplo, Edna caminha na floresta com um álbum antigo de fotos, e o enterra, como se a continuidade da velhice e de problemas com a memória estivesse afundando todas as suas lembranças num profundo esquecimento. Mostra que, muitas vezes, o verdadeiro horror não está em espíritos e criaturas demoníacas.
No quesito de terror mais "tradicional", digamos assim, a produção até que se sai bem, apesar de de que poderia ter feito algo mais impactante nesse sentido, mesmo com os poucos recursos que toinha. Há uma atmosfera pesada ressaltada pela fotografia, e os minutos finais apresentam um bom uso de maquiagem, mas, talvez um terror com carga ainda mais pesada e explícita (como Hereditário fez tão bem) desse uma força maior ao filme.
Ainda assim, mesmo que peque um pouco nesse aspecto, a produção oferece um bom desenvolvimento de personagens, além de uma mensagem, no mínimo, incômoda.
Logo após o clímax acontecer no terceiro (e movimentado) ato, A Relíquia tem um desfecho muito bonito e simbólico, que explicita o que quis dizer desde o início, numa cena que, mesmo grotesca (visualmente falando), também é muito triste. E de forma simples, mas eficaz, o filme nos lembra não somente do destino inevitável daquelas personagens, mas, também de todos nós.
Destaque também para o trio de atrizes, que conferem, cada uma à sua maneira, personalidades distintas a Edna, Kay e Sam. Em grande parte, são elas as responsáveis pela força do filme, permitindo que fiquemos engajados na história até o fim.
Resumindo: A Relíquia é uma produção bem interessante, e que se sobressai tanto pelas metáforas que apresenta sobre família, velhice e memórias, quanto pela diretora e pelas atrizes aqui presentes. Alguns pontos poderiam ter sido melhorados, e caberia até mesmo o filme ter mais tempo de projeção do que uma hora e meia para que pudesse construir melhor a passagem do segundo para o terceiro ato.
Ainda assim, continua sendo uma das gratas surpresas de 2020.
Nota: 8/10
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