Dica de Filme

Mad Max - A Estrada da Fúria
2015
Direção: George Miller


Um filme de ação pode ter conteúdo? Essa pergunta poderia soar meio estranha tempos atrás, na época de um "Exterminador do Futuro" ou de um "A Outra Face", por exemplo. Afinal, foram produções que, além da adrenalina, tinham uma estória com substância. Dita hoje, essa pergunta tem bastante relevância, pois os filmes de ação atuais sofrem da "síndrome Michael Bay": muito barulho, toneladas de efeitos especiais e um conteúdo que é nada menos que nada."Mad Max - A Estrada da Fúria" conseguiu, de certa forma, ser o filho bastardo dessa recente safra, mesmo pecando em alguns pontos.

Nele, vemos, mais uma vez, um futuro pós-apocalíptico, cuja a estética já tinha sido definida como influência para outros filmes do gênero já no primeiro "Mad Max", no longínquo ano de 1979. Esse tipo de ambientação pode dar diversas possibilidades ao roteiro, que pode expor críticas sociais bem pertinentes. E, de fato, temos muitas boas referências aqui. O vilão da estória, Immortan Joe, é tratado pelo povo da sua cidade como um Deus, ou, de certa forma, como um líder religioso que tem poder sobre uma massa faminta e desesperada. Essa massa passa por diversas necessidades, entre elas, a escassez de água. É uma das maneiras de Immortan Joe manter o controle.



Ele também possui um exército particular, de meninos guerreiros, que, como fanáticos religiosos, seguem todas as suas ordens. Chegam ao ponto de se suicidarem em combate, achando que vão para um paraíso, um tal de Valhalla. Não obstante, Immortan tem algumas mulheres trancadas num cofre, que considera como suas mercadorias. São usadas com um único propósito: procriação. O Islamismo pode ser notado nessas referências, mas também podemos ampliar essa visão a muitos contextos semelhantes com histórico de fanatismo.

No meio disso tudo, está Furiosa, uma imperatriz, que, sob o pretexto de ir buscar mantimentos fora da cidade, tenta resgatar as mulheres trancafiadas por Immortan Joe, e é implacavelmente perseguida por isso. No fogo cruzado, está Max, um renegado, que está ali por ter sido capturado, e ser usado como "bolsa de sangue" para alimentar os guerreiros (justamente, por ser doador universal).


A história, em si, parecia que ia render muito. Mas, não rendeu. A despeito da crítica religiosa e dos ecos feministas, o filme se foca demais nas cenas de ação (que são estupendas, digamos a verdade). Sim, é empolgante ver perseguições hiper realistas, e nisso, o diretor George Miller, no alto de seus 70 anos de experiência, foi perfeito. Mas senti falta de um aprofundamento maior e melhor organizado nos assuntos abordados.

A intenção é boa, e está clara. Só que, talvez, tenha faltado mais sequências do vilão subjugando seu povo, ou de diálogos envolvendo Furiosa e as mulheres que quer resgatar. Mulheres, inclusive, que são poucas (apenas 5), e, pela lógica, não justificasse tamanho esforço da parte dela, visto que deveriam ter outras na cidade que mereceriam ser salvas também.


Porém, mesmo com essas limitações, "Mad Max - A Estrada da Fúria" passa bem o seu recado. Mostra como a alienação numa fé cega pode fazer mal às pessoas, e ainda mostra a luta de algumas mulheres contra a opressão masculina. O fato de Furiosa aparecer mais do que o próprio Max só reforça isso, dando à produção algo de especial em relação a outras produções do gênero, onde a mulher acaba sempre sendo uma mera válvula de escape para o herói.

Muito se reclamou da atuação de Tom Hardy, pois ele estaria copiando demais os trejeitos de Mel Gibson no filme original. Mas, a questão não é essa. Max é um personagem taciturno, fechado e perturbado. Ou seja, caiu como uma luva para Gibson. Já, Hardy, por outro lado, não quer imitar ninguém, apenas entrega aquilo que Max precisa ser, só que sem tanto carisma.


Porém, é Charlize Theron quem rouba a cena como Furiosa, pois ela não apenas passa a representação de uma guerreira, mas de uma ideologia, de um propósito, que poderíamos chamar de universal, como a esperança e a luta de classes. E, a atriz consegue, de maneira competente, passar esse peso e responsabilidade nos ombros da personagem, além, é claro, de mostrar uma mulher de fibra, que enfrenta homens de igual para igual.

Só que o grande destaque são mesmo as cenas de ação. Gravadas, muitas vezes,  in loco, e com intervenções certeiras de computação gráfica, as perseguições não amenizam em brutalidade e em insanidade, empolgando toda a vez que surgem. Destaque para um guitarrista que "cospe" fogo com seu instrumento.


É um excelente filme de ação? Sim. A história valeu a pena? Também sim, mas ficou devendo em alguns pontos, como uma lógica mais coerente ou uma ousadia mais desconcertante. O filme, com algum esforço, poderia ser insano e coeso ao mesmo tempo. Felizmente, ele não é tão apelativo quanto se poderia supor, evitando até mostrar alguma cena de estupro (o que até seria até condizente com o enredo).

Entre altos e baixos, "Mad Max - A Estrada da Fúria" passou no crivo de um blockbuster que oferece mais do que o óbvio. Mesmo que de forma um tanto superficial, faz boas críticas, e ainda surpreende com cenas de ação bem orquestradas, mas não vazias de propósito. No contexto geral, pelo o que é oferecido pelo cinemão hollywoodiano atualmente está acima da média. E, isso já é muita coisa.


NOTA: 8/10

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