dica de filme ("Extermínio")


Dica de Filme

Extermínio
2002
Direção: Danny Boyle


Danny Boyle inaugura a nova moda dos zumbis no cinema com um filmaço

Alguns cineastas dispensam muitos comentários, seja para o lado positivo, seja para o lado negativo. No caso do visionário Dabby Boyle, dificilmente, encontraremos alguma produção meia-boca em sua filmografia. Isso porque o cineasta consegue imprimir um tom muito autoral em seus projetos, por mais que eles pertençam a um nicho bem específico. 

No caso de "filmes de zumbis", o que ele fez foi "apenas" iniciar toda essa onda dos mortos-vivos viraram pop, bem antes de The Walking Dead, por sinal. E, a culpa disso recai sobre um filmão chamado Extermínio.




As primeiras sequências de Extermínio já demonstram o domínio narrativo de Boyle. Numa sequência onde são exibidas cenas de violência de todos os tipos (terroristas matando possíveis dissidentes, policiais empancando manifestantes...), um chimpanzé, amarrado a uma mesa, observa tais cenas. 

Mesmo que a intenção disso seja explicada depois (provocar raiva no animal), o roteiro parece nos querer dizer que os seres humanos involuíram de tal forma, que precisamos "ensinar os nossos métodos" a outros seres vivos. O que se segue são cenas de pura angústia com uma estranha infecção se alastrando entre algumas pessoas, transformando-as numa espécie de zumbis.

28 dias depois...

Mais sequências arrebatadoras mostradas por Boyle, onde vemos Jim, personagem de Cillian Murphy, andando por ruas completamente desertas e devastadas de Londres. Um verdadeiro caos. A desolação tomando conta do ser humano. O perigo dele ser um dos únicos (se não o único) sobreviventes em meio à infecção. 

O filme demora um bom tempo mostrando esse ambiente, e o que outro cineasta faria de maneira rasa e inverossímil, Boyle tem a sensibilidade suficiente para que possamos imergir naquele universo, e (por que não?) nos importarmos um pouco com Jim, mesmo que o conheçamos pouco ou nada.




Interessante notar que o filme parece ser dividido em três partes bem distintas. Primeiro, ele nos apresenta o pequeno núcleo de protagonistas com quem devemos nos apegar e nos importar. Depois, coloca-os em perigos constantes contra os tais zumbis, em situações realmente pavorosas e angustiantes. 

E, por fim, e é aí que se encontra um dos grandes méritos do filme, os personagens principais passam a temer por suas vidas, não por causa de hordas e hordas de mortos-vivos, mas, devido ao pior dos monstros: o próprio ser humano.Muitas cenas do terceiro ato são repulsivas (mas, não apelativas), e expõem bem que, num momento de caos total, nós é quem somos o maior perigo.

"Nos últimos dias, tenho visto coisas horríveis. Mas, 4 semanas antes da infecção, também via coisas horríveis. E, 4 semanas antes também. Ou seja, é sempre a mesma coisa. Pessoas matando pessoas. Esse é o verdadeiros estado de normalidade de nossa sociedade", diz, em determinado momento, um dos personagens.

O roteiro de Alex Garland (diretor do recente Aniquilação) é preciso ao não explorar demais a questão do terror, e se concentrar bem mais no fator humano. Danny Boyle compreende isso muito bem, e dirige sequências que dão certo "respiro" na trama, ora mostrando cenas leves, quase descontraídas, ora cenas mais reflexivas. 

O bom é que nada disso soa apelativo ou caricato. Os diálogos são certeiros (alguns bem provocativos), e quando alguém abre a boca, realmente tem algo de útil a ser dito (algo um tanto raro em filmes usuais de terror).




Elogiar a direção sempre competente de Boyle é meio que chover no molhado, até mesmo porque aqui ele demonstra todo o seu vigor. Quando a narrativa precisa ficar acelerada, cortes bruscos e câmera na mão deixam o espectador atordoado. Quando precisa dizer algo a mais através dos cenários ou dos diálogos, a câmera para e foca bem no ambiente e nos atores. Que, por sinal, estão muito bem, com destaque óbvio para Cillian Murphy, Naomie Harris e Megan Burns, que dão muita verossimilhança aos seus personagens. 

Tudo se completa com uma trilha insana, composta por John Murphy, com momentos quase sublimes e poéticos da trilha, enquanto acena que se desenrola é justamente o oposto, fazendo, assim, um contraste perfeito.

É verdade que, em linhas gerais, não há nenhuma novidade em Extermínio. Trata-se do bom e velho filme de sobrevivência, onde é mostra que o nossos verdadeiro temor precisa ser a nossa própria espécie. Porém, tudo no filme é feito com tanto senso de urgência, com tanto frescor, com tanta garra, que fica impossível não sentirmos que estamos diante de algo especial: um autêntico filme de terror para adultos. 

Independente dele ter ou não iniciado, de fato, essa mais recente moda dos zumbis, o filme sobrevive (com o perdão do trocadilho) como um filmaço. E, "somente" por isso já basta, não?


NOTA: 9/10


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