dica de filme ("Louca Obsessão")

Dica de Filme

Louca Obsessão 
1990
Direção: Rob Reiner


Adaptação de obra de Stephen King é tensa, claustrofóbica e perturbadora

Ter um fã daquilo que você faz de melhor é prazeroso, e afaga o ego de qualquer um. A questão é quando lembramos que fã é, em sua origem, abreviação para a fanático, termo, ao contrário do outro, bem pouco lisonjeiro. E, fanático acaba por se encaixar muito bem em uma geração onde se perdeu bastante dos limites com relação à admiração por um artista. 

Não raro, muitos cometem verdadeiras loucuras, em nome do seu cantor ou escritor favorito, chegando às raias da sociopatia. Nesse sentido, o escritor best-seller Stephen King soube muito bem adaptar esse conceito mais absurdo de fã no livro Misery, numa história extremamente perturbadora, que funciona fácil como um enredo de terror.




A adaptação para cinema, lançada e 1990, muito se beneficiou de diversos fatores, fazendo o filme ser melhor do que o livro. Um desses fatores é ter pego um diretor no auge de sua forma (Rob Reiner), que, quatro anos antes, havia levado para a tela grande outra história de King, naquela que se transformou num dos mais clássico do cinema nos anos 80, Conta Comigo

Some-se isso ao fato de termos também uma atriz fenomenal (Kathy Bates), que soube brilhantemente compor uma personagem cheia de nuances, que vai, facilmente, da doçura à violência num piscar de olhos.

O enredo, por si, é bem instigante: após um escritor renomado sofrer um acidente grave na estrada, ele é resgatado por uma misteriosa mulher que se diz a sua fã número um, mas que, aos poucos, vai mostrando camadas bem inquietantes de sua personalidade. 

O escritor, enquanto se recupera, é obrigado a compor uma espécie de jogo de gato e rato, onde se sujeita a diversas humilhações, entre elas, destruir a única cópia de seu mais recente livro, onde a protagonista, que a sua tresloucada fã número um adora, morre no final. Isso sem contar outros momentos, digamos, imensamente dolorosos, mas, que não cabe dizer mais além disso.




A história se vale de elementos comuns aos melhores suspenses para construir uma trama em que o público é surpreendido a cada momento, e, principalmente, a nossa inteligência não é subestimada. Isso porque o filme aposta numa construção gradativa das situações mais tensas, mostrando o escritor tentando escapar de seu cativeiro quase sempre da melhor maneira possível. Se não consegue, é por conta de sua algoz, bem mais astuta do que ele, e, como toda boa sociopata que se preze, observa os mínimos detalhes ao seu redor para impedir que o seu querido escritor fuja de seu cativeiro.

De maneira bem correta também, a trama flerta com questões como a solidão e como o ego de um artista pode ser tão grande a ponta dele aproveitar a situação para compôr aquela que, segundo ele, é a sua melhor obra. 

Nesse sentido, fã (ou, fanática) e ídolo se igualam em desejos egoístas; uma, de ter a pessoa que mais admira sempre ao seu lado, mesmo que, pra isso, tenha que violentá-lo, e o outro, mesmo em momentos de grande perigo, não deixar de se sentir vaidoso diante de tamanha obsessão. Seria, então, alguém imensamente fanático fruto de um ídolo extremamente esnobe?  Seriam as faces de uma mesma moeda?




Só que tudo isso seroa irrelevante sem a atuação magistral de Kathy Bates, que merecidamente ganhou o Oscar por essa interpretação. Uma performance que consegue passar pavor e piedade, com uma diferença, às vezes, de segundos. 

Apenas seu "par" em tela, James Caan, que não está muito à vontade no papel, e dizem as más línguas, que ele não estava nem um pouco disposto a fazer Louca Obsessão. Certo mesmo é que a sua atuação é demasiadamente "travada" para um filme com uma história dessas. E, Rob Reiner nos presenteia com mais uma mão boa na direção, fazendo, narrativamente, a produção não ter atropelos, não se arrastando em nenhum momento.

Não é exagero dizer que Louca Obsessão está entre as melhores adaptações das obras de King, ali, no mesmo patamar de Conta Comigo, Um Sonho de Liberdade e Carrie, A Estranha. Um filme onde o terror está numa situação da qual você não pode controlar, e o sobrenatural reside na perturbadora cabeça das pessoas que não conseguem distinguir fã de fanático.

Baita filme, enfim.


NOTA: 8/10


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