DICA DE FILME ("Alita: Anjo de Combate")

Dica de Filme

Alita: Anjo de Combate
2019
Direção: Robert Rodriguez


Robert Rodriguez e James Cameron voltam em boa forma nesta adaptação alucinante de um dos melhores mangás cyberpunks lançados nos anos 90

Quando se fala de adaptações hollywoodianas de obras de outros países fora dos EUA, logo vem a sensação de ceticismo. Não é pra menos: boa parte dessas obras, na tentativa de adequar enredos e tramas complexas ao gosto do norte-americano médio, acaba piorando o produto original, ficando bem aquém das possibilidades. 

Um dos mais recentes exemplos disso foi a pavorosa versão estadunidense para Ghost in the Shell. Portanto, nada mais normal do que assistir a este Alita: Anjo de Combate (que, assim como Ghost in the Shell, também é baseado num mangá japonês) com o pé atrás. 

Porém, a boa notícia é que essa adaptação respeita bastante o material original e ganha um pouco de vida própria, apesar das falhas de roteiro.




O mais interessante é como o projeto começou. Um certo Guillermo Del Toro aí (conhecem?) vai e presente outro de James Cameron com o mangá Alita: Batlle Angel, do autor Yukito Kishiro. Para Cameron, foi "paixão à primeira vista", e, desde então, o cineasta sempre quis fazer uma adaptação norte-americana da obra. 

Bastante ocupado com a continuação de Avatar, eis que ele chama Robert Rodriguez para comandar o filme, ao mesmo tempo em que escreve o roteiro ao lado de Laeta Kalogridis, criadora e roteirista da interessante série para a Netflix Altered Carbon. De fato, tanta gente talentosa envolvida permitiu que Alita: Anjo de Combate saísse um pouco do lugar comum, fazendo do filme um ótimo entretenimento.

Muito do mérito do longa vem através de Cameron, que, como produtor do filme, possibilitou que ele tivesse o que há de melhor em termos de efeitos visuais. E, era preciso que, nessa parte, a produção se destacasse, afinal, estamos falando da história de uma ciborgue, que não sabe nada do seu passado, e vive num futuro pós-apocalíptico, cheio de possibilidades. 

Nesse quesito, o que mais impressiona é a protagonista, construída através da técnica de captura de movimentos. De início, realmente, a aparência dela pode estranhar um pouco (Alita parece um misto de live action com anime). Mas, a personagem é tão carismática, e tem um arco dramático tão bem construído, que fica impossível não simpatizar com ela. Fora isso, o designer de produção da Cidade de Ferro, onde ela mora com o seu "pai adotivo" (o dr. Dyson Ido) é impressionante e bastante crível. 

E, isso sem contar as cenas de ação, um verdadeiro deleite para os amantes do gênero.




Ok, agora falando do roteiro, esse é o grande "calcanhar de aquiles" do filme. Mesmo escrito por duas pessoas notadamente competentes e experientes (em especial, Camreon), acabamos vendo alguns deslizes injustificados. Um deles (talvez, o mais sério) é que existem aqui muitas situações com aquele ar "episódico", que acaba travando um pouco a trama central. 

Um desses momentos, por exemplo, é no começo do segundo ato, quando Alita e mais alguns jovens que ela conheceu exploram antigas naves que podem ter a ver com o passado da personagem. Isso sem contar que alguns bons dilemas são levantados, mas, nunca devidamente aprofundados. Da questão envolvendo classes sociais (a Cidade de Ferro é vista como o "depósito da escória" do lugar), à crise de identidade da própria Anita (a respeito da questão se um ciborgue pode ter ou não uma "alma"), todos os interessantes assuntos são rapidamente deixados de mão ou resolvidos com facilitações de roteiro. Produções anteriores como Elysium e A.I.: Inteligência Artificial fizeram melhor nesse aspecto. 

Ainda assim, mesmo com esse defeito, a trama de Alita: Anjo de Combate se sustenta bastante pelo carisma da personagem principal, e pelo ótimo ritmo imposto por Rodriguez.

Em termos de atuações, todos estão muito bem, a começar pela atriz Rosa Salazar, que, através da captura digital de movimento, consegue imprimir uma baita personalidade à protagonista da história. Já Christoph Waltz, apesar de bem no papel do Dt. Dyson Ido, precisa ir um pouco além das caras e bocas pelas quais ficou conhecido depois de Bastardos Inglórios. Mahershala Ali rouba a cena toda vez que aparece. Com calma e elegância, ele consegue construir um vilão bem assustador, apesar de um tanto unidimensional. Jennifer Connelly e Keean Johnson poderiam fazer melhor, mas, conseguem segurar bem os seus papéis. Somente Ed Skrein e Jackie Earle que ficaram um pouco caricatos demais como antagonistas, porém, nada de tão prejudicial assim ao filme. 

E, claro, mais uma vez, ressaltar a direção de Rodriguez, que consegue, mesmo com um roteiro oscilante, prender a nossa atenção por duas horas, fazendo com que algumas cenas, mesmo "episódicas", fiquem bem amarradas no contexto geral, fazendo um bom processo narrativo de causa e consequência.




Infelizmente, não estamos diante de nenhum filmaço, e isso isso só porque o roteiro não deixa. Mas, a construção visual desse mundo, o carisma de Alita e uma direção segura de Rodriguez garante uma ótima diversão por duas horas. E, melhor: com a promessa de uma continuação em breve. Com uma história mais bem amarrada, e se focando em poucos (mas, certeiros) pontos, quem sabe se não teremos um Alita 2 sendo um dos melhores filmes do ano em breve? Potencial, tem. Está tudo aqui. Basta ousarem um pouco mais.


NOTA: 7,5/10


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