DICA DE FILME ("UM TIRO DE MISERICÓRDIA")

Dica de Filme

Título: Um Tiro de Misericórdia
Ano de lançamento: 1990
Direção: Phil Joanou


Típico caso de produção que merecia mais reconhecimento com o tempo, Um Tiro de Misericórdia é um vigoroso filme de máfia moderna

Infelizmente, em alguns casos, grandes obras aprecem no momento errado. É o caso de Um Tiro de Misericórdia, excelente filme cuja temática gira em torno de um grupo de amigos em meio a grupos mafiosos de Nova York. O problema? A época do seu lançamento. Recapitulando: 1990 foi o ano de estreia de O Poderoso Chefão 3 e de Os Bons Companheiros. Ou seja, os olhos de público e crítica estavam mais voltados para produções mais consagradas sobre o tema, dirigidos por gente do naipe de Coppola e Scorsese. 

Porém, justiça seja feita: Um Tiro de Misericórdia não deixa nada a dever a esses outros filmes, com a diferença de que ele tem uma estética e uma abordagem mais moderna e menos clássicas que os outros. Ainda assim, ele consegue passar o que a temática da máfia no cinema tem de melhor: conflitos pessoais intensos (muitas vezes, familiares), que terão consequências imprevisíveis. 

Sim, por mais que um filme desse tipo tenha tiroteios e seja repleto de violência, o mais importante é que ele consiga trabalhar relações humanas de maneira palpável, para que nos importemos com aqueles personagens. Foi o que a trilogia de O Poderoso Chefão e todos os filmes de máfia de Scorsese fizeram. E, Um Tiro de Misericórdia está junto a esse seleto time.

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Todo bom filme de máfia que se preze precisa ter um roteiro que, mesmo simples, possa ser muito bem contado, e passar todas as nuances necessárias para desenvolver personagens fortes e marcantes. E este aqui tem. O primeiro a conhecermos é Terry Noonan, que se envolve, logo no início do filme, em um tiroteio e ganha a confiança dos chefões do crime organizado da região, que comandam justamente o local onde ele viveu sua infância, e que agora está de volta. 

Em seguida, vamos tendo contato com outros grandes personagens, como, por exemplo, o tresloucado Jackie Flannery, amigo de longa data de Terry, e o seu irmão Frankie, que agora é quem comanda as gangues do bairro a mando de um chefão ainda mais poderoso. Temos também Kathleen, irmã de Jackie e Frankie, que sabe das ações escusas destes, e que, ainda por cima, é apaixonada por Terry. 

São justamente essas relações de amizade e familiares que vão permear a trama até seu final, onde teremos traições, reviravoltas e segredos muito bem amarrados e construídos em um roteiro que não tem pressa em costurar as ações, passo a passo. Existe a temática da máfia e das gangues locais na superfície, mas, as camadas mais profundas da história são bastante humanas e verossímeis, permitindo uma espécie de identificação da nossa parte. 

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Paralelo a uma história bem elaborada, temos a direção vigorosa de Phil Joanou, que não perde o ritmo em praticamente nenhum momento, mesmo o filme tendo mais de duas horas de duração. Isso possibilita que ele realize sequências ótimas, como a cena da igreja, ou mesmo no momento de um inevitável tiroteio final, num uso muito certeiro do slow motion (câmera lenta) sem parecer forçado. Só pra constar: Phil Joanou é o mesmo diretor de um clássico da Sessão da Tarde, Te Pego lá Fora

Claro, o filme não é perfeito, e talvez a pior parte dele seja uma próxima do final, já no terceiro ato, onde Terry e Kathleen têm uma conversa bastante banal, e meio que quebra o ritmo da produção. Serve somente para introduzir o título original do longa ("State of Grace", ou Estado de Graça), que por sinal, não combina com o filme em si. Um pequeno detalhe que poderiam, sim, ter sido limado na edição que não faria falta nenhuma ao belo conjunto que o filme possui. 

E, obviamente que não dá pra falar de uma produção dessas sem mencionar as atuações, especialmente do trio principal de atores (Sean Penn, Gary Oldman e Ed Harris). O primeiro, interpretando Terry, faz uma composição ambígua do seu personagem muito interessante, o que vem a se justificar futuramente na trama. Oldman, por sua vez, está bem insano, numa espécie de versão mais jovem e impulsiva de Tommy DeVito, personagem eternizado por Joe Pesci em Os Bons Companheiros. E, por fim, Harris, com a sobriedade de costume, constrói um mafioso digno de nota. O restante do elenco, como Robin Wright e John Turturro, se saem bem, mas são bem eclipsados pelos demais colegas em cena. 

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State of Grace

Em suma, temos aqui um dos melhores filme de máfia moderna do cinema norte-americano dos anos 90 pra cá. Seu azar foi ter tido uma concorrência de peso à época, pois, méritos para ser lembrado por todo cinéfilo que se preze, ele tem de sobra: história envolvente, roteiro bem amarrado, direção segura e um elenco irretocável. 

Talvez fosse hora do filme ser (re)descoberto pelas plateias. Afinal, estas terão a oportunidade de assistirem a um filmão de máfia para além dos mais consagrados. 


Nota: 8,5/10

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