DICA DE FILME ("JUDAS E O MESSIAS NEGRO")

 Dica de Filme


Título: Judas e o Messias Negro
Ano de lançamento: 2020
Direção: Shaka King



Como não poderia deixar de ser, a mensagem social aqui é forte, mas, o que engrandece o filme é sua dupla de protagonistas

Filmes com temática de alguém infiltrado numa organização da qual não faz parte e que é o completo oposto dessa pessoa já rendeu ótimos exemplares, como o excelente "Infiltrado na Klan". Baseado em fatos, "Judas e o Messias Negro" vem com a missão de trazer um assunto similar, só que pelo lado contrário, onde temos um agente do FBI plantado no seio do grupo dos Panteras Negras. 

Mesmo com um assunto tão parecido quanto tantos outros filmes anteriores que já vimos e com certo esquematismo do roteiro (sabemos, mais ou menos, como cada acontecimento se desenrolará), a produção ganha demais com uma direção pulsante do novato Shaka King e principalmente com as atuações de Lakeith Stanfield e Daniel Kaluuya (este último, magistral). 




Apesar de andar por searas já bastante conhecidas de quem assiste com frequência cinema de cunho social, "Judas e o Messias Negro" ganha nosso engajamento, mesmo que ele seja construído aos poucos, sem grande pressa. A primeira cena de Bill O'Neal, o tal agente que vai se infiltrado nos Panteras Negras, não é lá muito boa, mas, dá um pouco da dimensão de quem seja aquele personagem. 

Um personagem, inclusive, que dará um pouco da tônica do filme, já que, entre a cruz e a espada, seu dilema ficará cada vez mais forte e pesado. Entre ajudar o FBI a destruir a organização dos Panteras Negras, tendo como um dos seus principais líderes o carismático Fred Hampton e se entregar aos discursos contundentes deste, a linha ficará muito tênue. 

O filme consegue explorar muito bem esses dilemas, visto que, além de se tratar de algo que afeta diretamente a consciência do personagem, ainda pode causar a sua morte. Contudo, talvez o longa tivesse ganhado mais se concentrasse mais cenas entre O'Neal e Hampton, e não entre o primeiro e um dos agentes do FBI, o calculista Roy Mitchell. 

Seria interessante ver mais cenas entre essa dupla de protagonistas, já que daria ainda mais força e dramaticidade à situação de O'Neal, e o filme fugiria um pouco de situações mais óbvias. Ainda assim, o pouco de tempo em que os dois interagem juntos é muito bom, e separadamente, compreendemos bem a trajetória de cada um.




Apesar do esquematismo do roteiro, a direção de King é muito competente, especialmente quando precisa extrair o máximo de seus protagonistas. A sequência de um discurso ("I am a revolucionary") é um bom exemplo disso, pois, fomos apresentados anteriormente a uma situação trágica, que culmina nesse momento, que é um dos impactantes do filme, e prova que Kaluuya é um baita ator. 

Inclusive, falando nisso, o filme é de Kaluuya, mesmo que o restante do elenco esteja muito bem. Transitando entre uma raiva contida (falsamente interpretada como calma) e explosões contundentes de revolta, o ator transpira o personagem em cada fala, gesto e olhar. Por sinal, seus olhos estão sempre vermelhos, caídos, cansados, exaustos, o que combina com a luta de Hampton. 

Baita interpretação!

Stanfield também se destaca, mesmo que de maneira mais contida. Ainda assim, seus dilemas internos são bem captados pelo ator, e sentimos o quanto O'Neal está numa corda bamba, que inevitavelmente o obrigará a fazer algo terrível. Mesmo sem a presença energética de Kaluuya, Stanfield está igualmente muito bom dentro do que lhe é exigido. 

Jesse Plemons e Dominique Fishback, aparentemente, estão em papeis menores, mas, não se enganem: eles têm muito mais a oferecer em suas interpretações, e seus personagens são bem mais interessantes do que aparentam de início. 




Ao final, "Judas e o Messias Negro" tem uma história bastante interessante, que gera o nível de revolta necessário para nos indignarmos contra o racismo, mas, a estrutura um pouco "certinha" da narrativa poderia ter dado lugar a algo mais instigante (aquele famoso "toque de gênio" que temos, por exemplo, em "Infiltrado na Klan"). 

Contudo, é uma história engajante e muito bem contada, que se engrandece bastante graças à entrega dos seus atores principais, especialmente, Daniel Kaluuya.  


 Nota: 8/10

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