Dica de filme ("The Batman")

 Dica de Filme


Título: The Batman
Ano de lançamento: 2022
Direção: Matt Reeves


Como fazer a diferença em meio à corrupção e à violência?

Renovação é uma das palavras-chaves em "The Batman", mais novo filme do icônico personagem dos quadrinhos. Essa renovação aparece aqui de maneiras interessantes, e em contextos diversos. Pode ser a renovação interna de um menino rico que passou por um trauma de infância, e que, ao se deparar com certas realidades sociais em sua própria cidade, vai questionar em alguma medida o seu desejo de vingança. Mas, também pode ser um desejo de renovação mais amplo, de uma sociedade menos corrupta e com menos injustiças. 

Seja como for, esse novo filme do Homem-Morcego traz à tona algumas questões que, de certa forma, passaram meio que despercebidas nas outras encarnações do personagem no cinema. Até que ponto Bruce Wayne é só um playboyzinho que se veste de morcego para, supostamente, combater o crime? O que o motiva? Frustração? Raiva? Desconhecimento da realidade? Não é por caso que aqui temos um Batman em início de carreira, não necessariamente tendo começado ontem sua carreira de vigilante mascarado, mas também sem muita experiência. 



Essa inexperiência se mostra bem forte quando ele mete os pés pelas mãos em certas ocasiões, e até se mostra excessivamente violento, o que é explicável para alguém que aderiu a vigilantismo à revelia da lei há menos de 2 anos, mas, nunca justificável (o filme faz questão de não passar pano para o seu protagonista). Ao mesmo tempo, também presenciamos um Batman meticuloso, observando cada elemento em cena, mostrando que ele, apesar de não ter se tornando o personagem totalmente frio e calculista que o público em geral conhece, ainda assim, demostra inteligência e sagacidade. 

Mas, em paralelo a isso, ele se mostra também um personagem triste, meio sem rumo, duvidando se pode ou não fazer alguma diferença em Gotham. O choque de realidade é constante, e ele se depara com um submundo de sua cidade que até bem pouco tempo atrás desconhecia (ou fingia desconhecer). É aí que temos outros dois personagens que representam uma espécie de tríade junto com Batman em busca de fazer o que é certo (justiça?): o comissário Gordon e Selina Kyle. 

Ao lado de Bruce Wayne, ambos entendem bem os meandros da corrupção em Gotham, e se mostram um tanto ingênuos perante os acontecimentos cada vez mais nefastos e violemos na cidade depois do assassinato do prefeito. Gordon se espanta ao descobrir que certos policiais e promotores estão envolvidos com a máfia, e Selina crê que pode vingar uma amiga em meio a esse turbilhão de violência. O próprio Batman passa a questionar por tudo o que lutou quando descobre alguns segredos obscuros de família. 



Ou seja, a busca pela renovação, seja de Gordon, lutando para combater o crime mesmo em meio à corrupção policial, seja Selina, infiltrada na máfia fazendo o que pode para sobreviver, seja o Batman, percebendo que "limpar" a cidade vai bem mais além do que atacar pequenos assaltantes e arruaceiros. O Homem-Morcego, inclusive, depara-se com o ciclo de sua própria violência, já no final, quando um garoto lhe diz "Eu sou a vingança" (a mesma frase dita pelo próprio Batman no início da história, quando ele usou de certa brutalidade desmedida). O filme, portanto, explora bem esses ciclos que se fecham, especialmente, o da violência e o da esperança. 

Obviamente que ainda estamos falando de um filme de super-herói blockbuster de Hollywood, então, é inevitável que tenhamos algumas cenas um pouco "convenientes" (os policiais não tirarem a máscara do Batman quando puderam é a parte mais nítida disso), ou outras partes um tanto melodramáticas, como a do personagem guiando pessoas com um sinalizador, o que não deixa de ser uma menção meio romantizada da Estátua da Liberdade com sua tocha em punho, mesmo que a cena também represente, em certo sentido, outras metáforas, como a luz nas trevas, ou a luz que guia. 

Relevem, pois, isso é o de menos, já que o filme é uma baita construção/desconstrução de personagem, com um Batman no início, e outro bem diferente  no final (final?). 

E destaque também para um dos vilões do filme (o Charada), que é um bom complemento ao que o filme quer dizer. Ele questiona alguns assuntos pertinentes, como os privilégios dos ricos e a podridão de corrupção nas entranhas de uma sociedade, mas, sem a história jamais justificar os seus atos. O mafioso Falcone também tem lugar destaque, mesmo sendo um personagem mais unidimensional. Nesse sentido, o Pinguim merecia um tempo em tela maior. 



Como cinema espetáculo, Matt Reeves conduz as quase três horas de "The Batman" de maneira quase hipnótica. As atuações estão muito competentes, e mesmo que a trilha sonora se sobressaia um pouco, ela é importante para a construção daquela trama (em especial, "Something in the Way", do Nirvana). Já as cenas de ação são pontuais e eficientes, principalmente, a da perseguição de carros.  

Enfim, aqui está tudo no lugar: um cinemão comercial com conteúdo relevante explorado de maneira até um tanto provocativa (mas, não tão ousada a ponto de questionar certos status quo, é importante dizer). Mas, convenhamos: também faz parte do espetáculo. "The Batman" foi bem longe para um blockbuster hoje em dia.

E, ao final, mesmo que não venha necessariamente uma renovação externa em Gotham como desejada, ao menos, o filme colocou algumas boas interrogações na nossa cabeça. 

Ou não? Fica ao seu critério. 


 Nota: 9/10


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