DICA DE FILME ("Birth/Rebirth")

 Dica de Filme


Título: Birth/Rebirth
Ano de lançamento: 2023
Direção: Laura Moss


Nosso eterno confronto com a morte

A maternidade é algo que acompanha todas as mulheres. Inevitavelmente. Seja por questões biológicas (afinal, são elas que engravidam), seja construções sociais, tanto para aqueles que querem ser mãos, para as que já são, ou para quem não quer, simplesmente, ter filhos. Mesmo nos dias atuais muita coisa envolvendo a maternidade é tabu, e, portanto, não deixa de ser interessante que um dos melhores filmes do ano (este "Birth/Ribirth") traga à mesa assuntos um tanto espinhosos, não sendo condescendente com as personagens femininas da trama, mas, também tecendo boas críticas sobre algumas problemáticas que as mulhres passam numa sociedade (ainda muito) machista. 




Tudo se ancora muito pela sensibilidade da diretora Laura Moss, tanto na sua condução narrativa (bem intrigante do começo ao fim), quanto no roteiro, que é co-escrito por ela e por Brendan J. O'Brien. Roteiro, esse, que desenvolve bem as protagonistas Rose e Celie, e, a partir do drama pessoal de uma, e do foco um tanto perturbador de outra em relação à ciência, o filme consegue abordar bem questões como luto, morte, maternidade (e todas as suas implicações) e desejos. 

Sim, desejos, pois, o que sustenta boa parte das alegorias de "Birth/Rebirth" é a vontade de ambas as protagonistas em se tratando da maternidade (uma querendo muito ser mãe, e a outra passando de todos os limites para meio que remediar um pouco de sua negligência materna). Nesse sentido, temas espinhosos são colocados na mesa sem medo ou pudor, como aborto e experiências bastante complicadas envolvendo pessoas (vivas ou não). 

Através disso, o roteiro de "Birth/Rebirth" atualiza uma certa história clássica de horror, só que pelo viés feminino dos tempos atuais, questionando de maneira bem pertinente os limites da ética científica, ao mesmo tempo que pede uma reflexão sobre o papel das mulheres em se tratando de maternidade, onde, inclusive, os homens possuem uum papel secundário, acessório mesmo. Nesse aspecto, é interessante notar como a história consegue abordar problemáticas femininas sem se ancorar em nenhuma figura masculina de relevância, quase como se dissesse que as mulheres possuem suas próprias dinâmicas e problemas, e que elas podem se resolver entre si.



Ao mesmo tempo, temos aqui uma crítica muito boa em como a vida em si é tratada quando a questão passa dos afetos mais íntimos para algo mais pragmático, não tratando somente vida e morte como eventos naturais, mas, como objetos de estudo que não levam em consideração a individualidade das pessoas, suas memórias, ou seja, tudo o que as tornam seres humanos. Porém, que fique claro: o filme não tece nenhum julgamento moral raso, no entanto, não se furta em apontar algumas contradições que valem a pena serem questionadas. 

Ao mesmo tempo, "Birth/Rebirth" se ancora não somente na direção e no roteiro, mas, nas atuações. Marin Ireland faz uma Rose fria e calculista, mas, que, em determinado momento, vislumbra-se com sua "criação" de uma forma quase ingênua, e essa dualidade de posturas é bem explorada pela atriz. Já Judy Reyes tem uma interpretação diferente de sua personagem Celie, mas, ainda assim, bastante interessante, pois, transita entre a apatia e a desilusão de uma vida materna que não a completa, e depois, para a mesma frieza que a Rose tinha no começo do filme, quase que numa troca de postura entre as personagens. Não é um trabalho fácil, contudo, as atrizes mandam muito bem (afinal, o filme se ancora praticamente 100% nelas).



Em suma, "Birth/Rebith" é um filme um tanto esquisito, mas, interessantíssimo por abordar temas muito complicados sob a ótica feminina, e não da maneira mais óbvia. Sob vários aspectos, é um drama, contudo, também é um horror, no entanto, não um horror gráfico com sustos fáceis. O amedrontador, no final das contas, é mesmo o mundo contemporâneo, e certa relativização da vida e da morte, mas, para voltar para um viés mais conservador, espiritualista, e sim, para questionar limites da ética no uso das pessoas (tanto de seus corpos, quanto de suas mentes). 

Numa realidade onde há um embate paupérrimo entre fé e ciência, "Birth/Rebirth" realmente é um filme provocador. 


Nota: 8,5/10

Comentários