Dica de Disco ("Hate for Sale" - Pretenders)

Título: Hate for Sale
Ano de lançamento: 2020
Artista: Pretenders

Pretenders volta afiadíssimo no multifacetado "Hate For Sale"; ouça

Volta às origens com MUITA categoria

É necessário que algumas bandas se aposentem. Outras, no entanto, possuem a incrível capacidade de continuarem não somente sendo relevantes no mundo da música, como também conseguem continuar lançando excelentes trabalhos, mesmo depois de anos de estrada, e apesar de "não se esperar mais nada" delas. Ou seja, ainda continuam a surpreender de alguma forma. 

Na verdade, esse "surpreender" no caso dos Pretenders é entre aspas mesmo, porque, pra quem já conhece os ótimos serviços prestados pelo grupo liderado pela Chrissie Hynde ao rock'n roll sabe muito bem que ela, sempre que pôde, conseguiu mostrar como é que se faz um som denso, mas com categoria. E é isso o que vamos encontrar no mais recente álbum da banda, Hate for Sale, que só pelo título já mostra a que veio. 

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Sim, o Pretenders voltou mais rock, porém, com a mesma atitude de sempre, e este disco aqui, felizmente, tem a aura dos melhores trabalhos que o grupo fez nos anos 80, mas, ao mesmo tempo, parece um som moderno. É possível? Sim, é. Isso porque a banda , até nos seus álbuns mais medianos, sempre expressou uma categoria e um bom gosto musical como como poucas. 

A primeira música (que se trata da faixa-título do disco), já mostra a que veio: um baita rock'n roll, permeado por guitarras bem potentes e uma gaita dando um charme a mais à composição. A letra não fica atrás, e faz uma óbvia crítica aos propagadores de ódio atuais: "Chame de sorte ou título herdado / Um cara assim é arrogante, ocioso / Ele pega e recebe o que quiser / Mulheres, carros e motos". 

A próxima canção, The Buzz, continua numa pegada roqueira, só que mais calma e emocional. A sonoridade remete bem alguma bandas oitentistas além do próprio Pretenders, como Echo & the Bunnymen. A letra, apesar da sonoridade mais tranquila, possui um tom crítico: "E você pensa que não se importa / E você acha que é sua escolha / Mas você está hipnotizado e segue / A voz do mestre de marionetes". 



Com certo swing, chegamos à terceira faixa, Lightning Man, que, por vezes, lembra algumas sonoridades do The Police, só que com mais peso. O que contrasta bastante com a próxima canção, Turf Accountant Daddy, um rock garageiro na mesma vibe de um The Stooges, por exemplo. Além de ser mais uma baita composição do disco, ela mostra uma padrão interessante em Hate for Sale: praticamente todas as faixas até aqui são ótimas, mas todas possuem algum diferencial. 

Anos de experiência e categoria inatas: é isso o que o Pretenders transborda até agora neste disco. Duvida? Então escute a linda You Can't Hurt a Fool, mais uma que destoa das canções anteriores, e ainda assim soa como tendo uma incrível unidade dentro da proposta do álbum. O título diz "Você Não Pode Machucar um Tolo", mas certamente, com esta canção, a banda pode emocionar muitos ouvintes por aí. Uma belíssima balada.

Jogo ganho com metade do disco transcorrido, o Pretenders então pode se dar ao luxo de soar um pouco repetitivo com a roqueira I Didn't Know When to Stop, uma canção rápida e que, mesmo não soando tão diferente assim das anteriores, ainda consegue empolgar. Quem sabe, sabe, não tem jeito. Como uma trovada à lá Lou Reed, Chrissie Hynde canta em Maybe Love Is in NYC os dissabores de uma cidade grande qualquer. As guitarras dão o tom emocional que a composição precisa. 



Chega então Junkie Walk, e ao invés de calmaria o que temos são guitarras distorcidas, e um jeito um tom cínico de canta da Chrissie Hynde. Pós-punk? Não, punk mesmo. Em essência. Didn't Want to Be This Lonely, por sua vez, tem uma sonoridade mais padrão (lembra até algumas - boas - canções recentes do Pearl Jam), tendo até um clima mais alegre, digamos assim, apesar da letra mandar um recado muito bem dado: "Bem, eu não queria ficar tão sozinho / Embora te perder fosse um alívio / De uma vida com apenas um homem / Desprovido de moral ou crença".

Infelizmente, o disco se encerra com apenas 10 faixas, sendo a última, Crying in Public, uma canção mais melancólica, com Hynde tendo como acompanhamento um belo piano. Lembra a linda Hallelujah, de Burt Bacharach, só que na voz de Jeff Buckley. Maneira perfeita de terminar um álbum irretocável. 

Quem ainda tinha dúvidas de que o Pretenders ainda tinha fôlego, pode escutar Hate for Sale, e se surpreender com o resultado. O que temos aqui é um dos melhores discos de 2020 lançados até o momento. E, melhor: de uma banda veterana que sabe que não precisa mais provar nada pra ninguém, e que não necessita reinventar a roda, mas que com muita categoria, sobriedade e atitude demonstra que ainda tem um discurso afiado e uma sonoridade poderosa. 

Parabéns a Chrissie Hynde & cia. 👍


Nota: 9/10

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