DICA DE FILME ("LIMITE DE SEGURANÇA")

 Dica de Filme


Título: Limite de Segurança
Ano de lançamento: 1964
Direção: Sidney Lumet


Os limites (ou a ausência deles) numa guerra nada "fria"


Entre as décadas de 50 e 80, o "perigo vermelho" rondava o ocidente, e as narrativas giravam em torno de que o comunismo invadiria os ditos "países civilizados", com a implantação de um regime de terror. O tempo mostrou que tudo não passou de uma narrativa terrorista em nome da hegemonia econômica de certos países, mas, enquanto pôde, funcionou muito bem. Especialmente, na arte.  

Não faltaram obras em diversas áreas que explorassem esse medo quase insano da Guerra Fria, e mais especificamente, de um ataque nuclear. Muitos filmes de ficção científica, por exemplo, foram uma metáfora clara a esse medo. 

Só que alguns realizadores geniais (aqui, especificamente do cinema) abriram mão de contar uma versão padrão dessa narrativa, e resolveram subverter as expectativas. Foi o caso de Stanley Kubrick com o "Doutor Fantástico" e Sidney Lumet como "Limite de Segurança". 

O que muda em ambas as obras é apenas o tom. Enquanto, a de Kubrick é uma sátira debochada e ferina aos ditames da guerra, a de Lumet adota um tom mais sério, e por vezes, sombrio, do que poderia ter acontecido se (e somente se) uma única falha tivesse acontecido nessa disputa. 

Tais filmes, cada um a sua maneira, são formidáveis. 




Como é de hábito na obra de Lumet, em "Limite de Segurança" temos pouquíssimos cenários, onde o que conta mesmo é a movimentação de câmera e diálogos afiados para contar a história. Mesmo que, de início, a experiência possa parecer monótona, e que não vai levar a lugar algum, a sucessão de acontecimentos vai numa gradação muito bem construída, com cada vez mais elementos de tensão. 

Nisso, direção, roteiro e atuações brilham. 

O público já sabia bem o talento de Lumet em compor cenas incríveis apenas mudando a posição de sua câmera em "11 Homens e uma Sentença". Aqui, não é diferente. Mesmo em ambientes "limpos", onde só estão em cena dois homens e um telefone, o diretor mostra o close de um olho, de uma boca, do fone no ouvido, ou gira a câmera intercalando ambos os personagens. É uma narrativa bastante imersiva. 

Já o roteiro vai construindo suas peças aos poucos, não desperdiçando nada, e até mesmo retornando com um certo personagem lá pelo clímax, que foi apresentado no início, e que parecia não ter importância para a história principal. E, os diálogos, como não poderia deixar de ser, são mordazes, especialmente quando a proposta é criticar os poderosos que detém o domínio de vidas numa guerra. 




É evidente que, como estamos falando de um filme de Lumet, estamos diante de um filme humanista e anti-bélico total, que também mostra uma característica inerente às produções do cineasta, que é a presença constante da ética e da hombridade nos personagens. Ou seja, não há aquele patriotismo plastificado na maior parte dos filmes de guerra que vemos por aí. 

No campo das atuações, todos estão bem, mas, não tem como não destacar as excelentes interpretações de Henry Fonda e Walter Matthau. 

O primeiro faz o presidente dos EUA, e é palpável o peso que ele carrega em certas decisões que precisa tomar, especialmente na parte final do filme. Já Matthau faz muito bem o frio e calculista Prof. Groeteschele, que meio que representa aquela parte prática de quem comanda a guerra, e que não passa ojeriza em suas colocações (mesmo que contenham algum verdade nelas). 

E, como um conjunto de fatores, "Limite de Segurança" se assemelha mais a um thriller, onde o suspense permeia a trama a partir de um determinado ponto, deixando o espectador angustiado e incerto do desfecho da obra (e, para os espectadores da época, certamente, para o mundo real). 




Em linhas gerais, podemos dizer que "Limite de Segurança" é, sim, um filme de guerra. Afinal, mostra os bastidores e os meandros de um conflito sem sentido, e que pode dar muito errado por causa de pequenos, mas significativos, detalhes. Detalhes, esses, que custam milhares e até milhões de vidas. 

E, assim como "Doutor Fantástico", não esperemos redenção aqui. É a crítica pura e simples (e bastante amarga) das consequências desse tipo de estupidez. Brilhantemente atual. 


Nota: 10/10


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