DICA DE FILME ("Lua de Papel")

Dica de Filme


Título: Lua de Papel
Ano de lançamento: 1973
Direção: Peter Bogdanovich


Um roadie movie paterno (e peculiar)

Relações paternas (ou que se assemelham a isso) nem sempre são agradáveis. Muitas são conturbadas, e às vezes parecem mais uma comédia de erros. Nesse último caso, é o que mais ou menos encontramos aqui na história de "Lua de Papel", com os personagens de Moses e Addie, que em nenhum momento do filme é confirmado que se tratam mesmo de pai e filha.

Mas, não precisa. 

Está implícito, e a relação de ambos, repleta de sentimentos conflitantes (ora de carinho e afeto, ora de puro interesse pragmático) revela duas pessoas bastante idênticas, mesmo nas diferenças, onde cada um ali procura sobreviver por meio da malandragem e da esperteza, mesmo que nem sempre com resultados satisfatórios.

Moses aplica golpes, como na venda de Bíblias para parentes de pessoas mortas que nunca fizeram essa compra, e Addie, mesmo muito novinha, já fuma e muitas vezes fala como adulta, cheio de ardilosidade. Porém, tudo isso esconde muitos sentimentos, muitas frustrações, muitos desejos. 

E é nisso que se ancora "Lua de Papel": uma tenra história sobre duas pessoas um tanto perdidas que encontram entre si uma conexão e um entendimento de mundo muito parecido. 




Addie parece já ter nascido adulta, mas, em pequenos e singelos momentos, ainda vemos que ela é uma criança, como na cena em que ela olha para o retrato de sua mãe já falecida, ou quando tira uma foto num parque de diversões sozinha, mas, queria estar com Moses na fotografia. 

Este também parece já ter nascido adulto, esperto, malandro. Mas, assim como Addie, mostra em pequenas situações, o quanto pode ser ingênuo e até infantil. Por isso, na viagem que ele a menina farão, algo a mais parece surgir entre ambos, um sentimento quase fraternal, mas, que não se externa em palavras, afinal, os dois são quase sempre muito ríspidos um com o outro. 

O filme também aproveita certos momentos para tecer alguns comentários ácidos a respeito do racismo (ainda bastante em voga nos EUA dos anos 70 - na verdade, ainda hoje é), e também como aos excluídos só resta a malandragem como forma de sobrevivência, ao mesmo tempo que as autoridades podem ser tão ou mais criminosas (a sequência de um delegado metido com contrabando de bebidas em plena Lei Seca mostra bem isso). 




Enquanto comédia, "Lua de Papel" é divertidíssimo, ancorado muito pela relação de Moses e Addie, que é muito cativante graças ao roteiro bem construído e aos atores Ryan O'Neal e Tatum O'Neal, cuja química aqui está perfeita, com diálogos muito bons de ambos. Tudo se completa bem com uma direção competente de Peter Bogdanovich, segura e sem grandes novidades. 

Nas entrelinhas, "Lua de Papel" é uma jornada de conhecimento, interna e externa. É como se as relações fossem viagens de descobertas, onde encontramos conexões e desavenças. Neste caso, por se tratar de uma relação de possíveis pai e filha, a coisa toma uma simbologia bem maior, pois, um é reflexo do outro, seja na propensa esperteza de passar a perna nos outros, seja em algo mais íntimo, que revela um desejo de ser aceito por alguém. 




"Lua de Papel", portanto, é um filme da busca de si pelo outro, de criar vínculos, de se sentir realmente como parte de uma família. Uma história, enfim, de pessoas perdidas em um mundo igualmente perdido. 

Nota: 8/10

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