Disco Mais ou Menos Recomendável

Eu Vou Fazer Uma Macumba Pra te Amarrar, Maldito!
2015
Artista: Johnny Hooker


Há várias maneiras de se analisar uma obra de arte. Uma delas é, sem dúvida, ir de mente aberta, esquecendo tudo o que se falou de tal artista, seja de bom ou de ruim. Isso evita, de uma certa forma, a manipulação da opinião que se vai ter. Só que nesses tempos de Redes Sociais, em que o hype é a forma vigente de qualquer coisa (a chamada "melhor banda de todos os tempos da última semana"), é necessário ir ver (ou ouvir) algo fazendo-se um esforço ainda maior.

Dito isto, verdade seja dita: nos últimos tempos, falou-se muito de Johnny Hooker; demais, até. Com tanta exposição, a desconfiança de "fogo de palha" é inevitável. Pensando nisso, então que, simplesmente, não nos esqueçamos de tudo o que foi dito sobre ele (para o bem e para o mal), e vejamos quem tem razão (se é que existe razão suficiente para se falar de arte).

Pra começar, Johnny Hooker é figura carimbada na nova cena recifense desde o Candeias Rock City, que bebia na veia glam rock descaradamente, e fazia shows performáticos muito bons (quem não se lembra de sua apresentação no Abril Pro Rock?). Então, se hoje vemos o cantor vestido de forma extravagante, não o culpemos de oportunismo, apesar desse tipo de figurino estar longe do ineditismo (um amém para o santo Bowie, por favor!).


E, aí chegamos na parte principal, a música, e este primeiro disco dele, o "Eu Vou Fazer Uma Macumba Pra te Amarrar, Maldito!" O álbum começa de maneira vigorosa, verdade seja dita, com a canção que dá título ao trabalho. Mesmo que o som e a voz sejam do tipo que já ouvimos em algum lugar, alguma única vez, pelo menos, não tem como negar que é um bom começo.

Chega a segunda faixa, "Volta" (trilha do ótimo filme "Tatuagem"), e, realmente, a coisa não se sustenta. A música realmente casou bem com a aura do filme, sendo executada em determinada cena dele de forma belíssima. Mas, em disco, a gente percebe melhor que estamos ouvindo mais do mesmo, algo entre um Cazuza e uma Gal Costa, porém, enfadonha pra quem já tem uma certa bagagem musical.

"Alma Sebosa" segue, à risca, o mesmo esquema: a reciclagem de elementos antigos, que vão do brega à jovem guarda, só que com pouca coisa nova, e sem identidade. Dá até pra cantar junto, no entanto, falta aquele tempero a mais. E, o que dizer de "Chega de Lágrimas", que chega a lembrar um pouco Los Hermanos? É até melhor do que as demais porque, ao menos, tem umas boas variações, o que dá um certo dinamismo. O danado é que ainda não dá pra encontrar identidade no som até aqui!


O início blues de "Amor Marginal" é bacana, e a interpretação do cantor é melhor quando está mais contida. Ao que tudo indica, quanto mais histriônico fica, mais a sua música parece imitação do que já ouvimos tantas outras vezes. Quando encarna algo mais sereno, mesmo não construindo nada de extraordinário, a arte de Johnny Hooker fica mais interessante. Ah, é preparem-se para muitos ecos de Cazuza em "Amor Marginal".

Ecos, esses, que também estão muito presentes em "Segunda Chance". Aí fica a indagação: se é para escutar o eterno compositor de "O Tempo não Pára", não seria mais lógico pegar seus discos antigos do que escutar um cantor atual que, na maioria do tempo, só o faz imitar de alguma maneira? Nada contra referências e inspirações; elas são necessárias. Mas, além disso, é preciso buscar também uma cara própria, senão, fica tudo parecendo muito "fake". E, esse primeiro disco de Johnny Hooker passa muito essa sensação até o momento.

A segunda metade do trabalho começa mais instigante, com "Boyzinho". Batucada e clima sombrio no talo. Mas, aí, a voz de Hooker vem, e, ao invés de Cazuza, agora "quem estamos escutando" é Caetano Veloso. Parece mesmo que o cantor quer passar essa sensação de cópia. Não se sabe se por comodismo (uma bela zona de conforto) ou por algum outro motivo. No entanto, a falta de esforço para não soar como outros artistas conhecidos, incomoda.


Alguma impressão mais positiva só chega, de fato, com "Boato", seis canções depois da (ótima) primeira música. Assim, fica difícil... Até porque, esta aqui é muito boa, com naipes de metais bem dosados e clima de cumbia muito latente. Alegre e despretensiosa. Talvez, a melhor de todo o disco. Já, "Você Ainda Pensa?" volta à sensação de que estamos ouvindo algo requentado, mesmo que a imitação, desta vez, seja mais para a atual música independente do que para a tradicional MPB.

O encerramento vem com uma surpresa, diga-se: "Desbunde Geral". Mesmo que, claramente, influenciada pelos carnavais das antigas, agora sim, estamos "escutado" Johnny Hooker. Incrivelmente, no final, ele encontra alguma identidade, apesar de não ser nada de marcante. E, ainda há uma versão em espanhol de "Alma Sebosa" que pouco acrescenta no contexto geral. Bom dizer que nenhuma das letras realmente é digna de nota. É o velho choramingo depressivo de amores perdidos, ciúmes, traições, dores de cotovelo, etc. Ou seja, nada de novo no front.

A afetação na música é boa, inegavelmente. Afinal, essa atitude já gerou artistas como David Bowie, New Yok Dolls, Iggy Pop, Secos e Molhados, Caetano Veloso, Cazuza, entre tantos outros. Só que todos não vinham só com figurinos exagerados ou interpretações carregadas. Sempre tinham um "quê" a mais na música que faziam, seja nas letras, numa sonoridade diferenciada, e por aí vai. Johhny Hooker, chegou, e pegou só a afetação, esquecendo-se do resto.


"Eu Vou Fazer Uma Macumba Pra te Amarrar, Maldito!" só impressiona quem talvez não conheça, a fundo, todas as referências de Hooker. Pra quem já as têm de cor e salteado, irão, se não hoje, provavelmente, amanhã, revisar um passado que não virou hype, e perdura até hoje. Boa sorte a Johnny Hooker, mas, ele, realmente, precisa mostrar mais a que veio.


NOTA: 5/10

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