Dica de Filme ("Amor Maldito")

 Dica de Filme


Título: Amor Maldito
Ano de lançamento: 1984
Criação: Adélia Sampaio


Retrato atemporal de uma sociedade conservadora

Primeiro, vamos a um fato de grande importântica histórica para o cinema nacional: "Amor Maldito" foi o primeiro longa-metragem brasileiro dirigido por uma mulher negra. Pode parecer algo trivial atualmente, mas, é só pesquisar quantas mulheres negras, hoje no Brasil, estão diretamente envolvidas na sétima arte (poucas). Então, temos aqui uma obra, acima de tudo, pioneira.

Porém, além dessa questão, o filme em muitas outras qualidades: fala sobre fanatismo relgioso quase 4 décadas atrás, explora o preconceito homofóbico da sociedade (que ainda hoje persiste), e ainda é um boa história de tribunal (um subgênero bem mais explorado em Hollywood).




O filme se concentra na história de amor entre Suely e Fernanda, com seus eventuais problemas, altos e baixos, e uma tragédia que vai pontuar boa parte da narrativa, expondo o que de pior a sociedade conservadora e metida a moralista tinha (e tem). 

O longa começa com Suely ganhando um prêmio de miss, numa aura meio de sonho, meio de devaneio, onde depois, vemos o destino da personagem. Isso vai abalar as estruturas de Feranada (com quem mantinha um relacionamento) e sua família (extremamente religiosa). É quando a história passa a se focar no julgamento de Fernanda, com toda a sorte de violências, preconceitos e humilhações; tudo, basicamente, pelo fato, dela ser lésbica. 

Entre flashbacks, o filme vai reconstruindo todos os acontecimentos na vida dessas mulheres, do seu convívio pessoal, do seio familiar extremamente abusivo que Suely era submetida, entre outros fatos, como se nós, espectadores, também fôssemos jurados naquele tribunal. E, tudo para expor a hipocrisia de cidadãos de bem acima de qualquer supeita, casados, com filhos, tementes a Deus, mas, que podem cometer os maiores pecados. 




O filme tem alguns vícios do cinema nacional (certas interpretações um tanto teatrais demais e diálogos expositivos), mas, de forma alguma, isso, enfraquece a obra. Primeiro, porque a talentosa Adélia Sampaio mostra uma direção segura, explorando as situações e os ambientes com bons enquadramentos e jogos de câmeras (especialmente, nas cenas do tribunal). Sem contar ainda que algumas atuações aqui são ótimas, em especial, dos atores que fazem os advogados. 

O roteiro, bastante crítico e contundente para a época (e, até para os dias atuais, infelizmente), não tem medo de mexer em vespeiros, onde vemos um pastor evengélico completamente fanático em sua crença, e que, nas entrelinhas, até demonstra ter alguma espécie de perversão sexual reprimida, e uma justiça corrompida, onde, na melhor cena do longa, temos uma conserva dos advogados em off que basicamente mostra que aquele julgamento não passa de um teatro da hipocrisia. 


"Amor Maldito", de fato, é uma produção de imenso valor histórico e social. Além de ser um bom filme com uma trama coesa, ainda traz as mazelas de uma sociedade que se ancora em suas crenças para posar de santa, mas, que, no fundo, acaba se mostrando um antro de perversão (os recentes escândalos de abusos e orgias envolvendo padres, pastores ou simplesmente qualquer pessoa moralista, mostra bem isso). O que faz com que essa filme acabe sendo atual. Bem atual. Bom, porque se trata de um registro para importantes reflexões. E, ruim, pois, demonstra que muita coisa permenece como antes. 

 Nota: 8/10


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