Debate Sócio-Político

QUEM TEM MEDO DE PROTESTOS?


Desde junho do ano passado, o Brasil vive uma grande efervescência. Mesmo que de forma um tanto esparsa, estão ocorrendo manifestações em diversas cidades. Como característica principal, várias delas são apartidárias. Outro ponto a destacar são as reivindicações, quase todas unânimes, relacionadas, por exemplo, à saúde e à educação. Podemos também citar o fato de que muitas surgem a partir de greves ou paralisações de certas categorias, como os professores ou policiais.

No entanto, e como era o esperado, esses protestos não estão sendo vistos com bons olhos. Justamente por serem apartidários, são acusados frequentemente de serem influenciados ou até financiados por partidos de oposição, por baixo dos panos. Porém, muitos parecem não perceber a lógica: qual partido com estrutura suficiente iria "comandar" uma massa muitas vezes de milhares e milhares de pessoas contra um governo específico? Nessa hora, poucos se lembram de que essas manifestações têm como alvo tanto o governo federal, quanto os estaduais. Ou seja, seria necessário imaginar que todos os partidos políticos estão financiando esses protestos contra todos, o que se configura como algo absurdo.


Quem é contra os protestos também possui o argumento de que os gastos com a Copa do Mundo (um dos principais pontos de críticas nas manifestações) são inferiores ao que são destinados a serviços essenciais. Até agora, esse evento esportivo custou cerca de 25 bilhões de reais. Ao passo que, nos 12 anos de governo petista (incluindo Lula e Dilma) foram em torno de 700 bilhões destinados à saúde e à educação. No entanto, peguemos a palavra "investimento". Como o próprio nome já diz, são gastos que, na prática, poderão trazer benefícios concretos. Agora, vem a constatação: pode-se confiar plenamente em nosso sistema de saúde pública? As escolas e universidades públicas estão formando crianças e jovens de maneira correta? Não basta, pois, injetar uma quantidade absurda de dinheiro. É preciso fiscalizar se, de fato, estamos tendo retorno nessas áreas. Vistos por essa ótica, os "modestos" 25 bilhões da Copa acabam sendo algo realmente desnecessário.

Essa reportagem de O Globo ilustra bem essa questão de como anda um desses serviços essenciais (no caso, a saúde pública), mesmo com tanto montante investido:


Contudo, o que talvez seja pior é o chamado terrorismo de opinião, é a cultura do medo em propagar situações inverídicas. Esse vídeo, por exemplo, mostra o atual ministro do esportes Aldo Rebelo não só desdenhando os protestos atuais, mas dizendo claramente que se tratam de movimentos anti-PT, com o intuito de derrubar Dilma e desmoralizar Lula:


Mas, é bom ressaltar que muitos que estão nas manifestações recentes nunca participaram de algo assim, e, por vezes, sentem-se "perdidos". Porém, isso não é problema dos mais sérios. Mesmo que, em certas ocasiões, o clima de "festa" impere, ainda é válido essas pessoas estarem nas ruas. A consciência política não nasce do nada; é uma construção, com suas eventuais falhas. Aqui Eduardo Galeano, escritor de "As Veias Abertas da América Latina", expõe bem a importâncias desses protestos ocorrerem:


Essa verdadeira onda de "criminalização" dos protestos populares no Brasil esbarra num princípio básico: o direito constitucional à livre manifestação. O artigo 5° do inciso XVI da Constituição diz: "Todos podem reunir-se pacificamente, sem armas, em locais abertos ao público, independentemente de autorização, desde que não frustrem outra reunião anteriormente convocada para o mesmo local, sendo apenas exigido prévio aviso à autoridade competente". Salvo alguns pouquíssimos grupos armados (quase irrisórios), 99% dos ocupantes nas ruas estão munidos apenas de cartazes e máscaras. E, o dito aviso às autoridades já está antecipado em pelo menos um ano. É, pois, criminoso querer proibir (ou coibir) tais movimentos.

Motivos para protestar existem, e são inúmeros, a começar pela corrupção generalizada, cujo escândalo da Petrobrás é o mais recente exemplo. Seguem vídeo e site explicando um pouco mais do caso:

entenda as denúncias sobre a Petrobras - UOL Notícias





Manifestar-se contra a realização da Copa do Mundo no Brasil não significa ser contra o futebol ou o governo do PT. As questões são mais profundas, estando elas, porém, a olhos vistos, inclusive na análise de órgãos de imprensa de outros países, como a revista alemã “Der Spiegel”:

Revista alemã faz novas críticas à organização da Copa do ...


Portanto, "criminalizar" os recentes protestos é prestar um desserviço em nome de ideologias políticas, que numa democracia, devem estar abaixo do interesse público. As vozes nas ruas, enfim, não serão caladas tão facilmente.


ERICK SILVA

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