Dica de Filme

O Quarto de Jack
2015
Direção: Lenny Abrahamson


A metáfora e o simbolismo são elementos primordiais para o cinema. Isto é, quando sã bem empregados. Pois, geralmente, as estórias não têm feeling para contar uma coisa mostrando outra. Pra isso, é preciso uma boa dose de talento e sensibilidade. Junte a isso atores que defendem seus personagens com fervor. Pronto. Temos aqui um filme que, além de bonito, possui mensagens em camadas que vão se desdobrando ao longo do tempo, reconfortando o espectador. Emocionante, sim, mas, nada de piegas.

A princípio, "O Quarto de Jack" tem similaridade com "A Vida é Bela". Em ambos os casos, crianças são protegidas da realidade pelos seus pais, usando, pra isso, a imaginação fértil dos pequenos. Só que aqui, há uma diferença: o nível de isolamento. Jack e sua mãe Joy estão confinados num quarto, em cárcere privado. Jack nunca viu o mundo "real", lá fora. O único contato externo que tem é através de uma TV. Já, Joy, de início, é mostrada a nos como uma mãe perturbada, e até negligente. Mas, acredite: é apenas o início, e o roteiro reserva ótimas surpresas e entendimentos depois.




Esses entendimentos, por sinal, referem-se à caracterização dos personagens, principalmente da mãe de Jack. Parece que o roteiro, propositalmente, apresentou um esteriótipo dela para testar nossa capacidade de julgamento alheio. E, garanto que muitos, logo de cara, acham muitas atitudes dela absurdas para quem está numa situação tão difícil com o filho. Este, inclusive, aparenta ser o mais sábio e equilibrado dos personagens, até mesmo entre os adultos. Suas observações sobre o mundo são tão inocentes quanto verdadeiras.

O filme é, claramente, divido em duas partes: uma que se passa durante o confinamento no quarto e outra que retrata a vida de ambos após fugirem e recomeçarem a conviver na sociedade. E, ambas são interessantes, sendo a primeira, óbvio, mais angustiante. No entanto, o melhor desenvolvimento da estória se dá no segundo momento, onde vemos os esforços de Jack e Joy para permanecerem juntos e sãos, e ainda lidarem com conflitos familiares não resolvidos. E, essa readaptação pela qual eles passam possui uma incrível sensibilidade.




Bom destacar que as observações que Jack faz a respeito do "mundo" são ótimas. Isso porque ele tem ideias bem distintas estando dentro do quarto desde que nasceu, e outras que não diferem muito quando ele fica em liberdade. Apenas seu mundo físico se amplia, mas sua consciência sobre a vida permanece intacta, sempre tentando ver o melhor em tudo, experimentando de tudo. É ele o fio de ligação entre nós e o que a produção quer passar.

Incrível como o roteiro trata dessas questões sem que as situações pareçam inverossímeis ou absurdas. Mesmo aquilo que apenas aparenta ser um ou outro furo na estória, é perfeitamente explicado depois. Basta ter a paciência necessária e se deixar levar pela trama. Talvez o dado negativo seja o filme não dizer qual o paradeiro do sequestrador, que, na segunda parte, simplesmente, desaparece da estória, sendo mencionado apenas uma única vez.




Outro destaque positivo são as atuações. A princípio, Brie Larson, que faz Joy, e Jacob Tremblay, intérprete do pequeno Jack, não parecem ter alguma espécie de empatia. Mas, é o roteiro que aqui faz a diferença, pois a relação de ambos é pra se mostrar, de fato, conturbada, mesmo o amor entre ambos ser enorme, e bastante honesto. Os atores entenderam isso, e, ao longo da produção foram criando a afinidade que os personagens precisavam, culminando em momentos realmente emocionantes.

Portanto, tirando uma ou outra condução mais truncada da estória e a falta de destino do sequestrador, "O Quarto de Jack" é um eficiente retrato da necessidade constante de amadurecimento pelo qual passamos, mas, que é ofuscado, muitas vezes, por estamos presos a um "quarto", ou, simplesmente, a uma visão limitada das coisas. Um dos filmes mais sensíveis que estrearam nessa recente temporada.


Nota: 8,5/10

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