Dica de Documentário

O Ódio na Internet
2014
Direção: Rokhaya Diallo e Mélanie Gallard


Infelizmente, nos últimos tempos, a Internet vem se transformado numa plataforma muito eficiente para disseminar o ódio e a intolerância. Uma das vítimas dessa recente "modalidade" na Rede foi a jornalista francesa Rokkaya Diallo. Muito ativa nas redes sociais, ela sempre expôs muito de sua opinião nelas, e isso sempre gerava discursos enraivecidos contra sua pessoa. A gota d'água foi quando recebeu, via Twitter, uma ameaça de estupro: "Alguém tem que estuprar a idiota da Rokhaya. Assim, o racismo acaba." Em ataques anteriores, Rokhaya ignorou as ofensas. Desta vez, no entanto, decidiu revidar, e foi daí que surgiu a ideia deste documentário.

Primeiro, procurou um advogado para saber que atitude tomar. Surpresa, viu que os trâmites para se denunciar um crime virtual é mais complicado do que se imagina, principalmente, devido à empresa que controla determinada plataforma na Rede (nesse caso, o Twitter), que usa de suas políticas de liberdade de expressão para não divulgar a identidade dos usuários que disseminam discurso de ódio na Internet. Em paralelo à sua busca por justiça, Rakhaya encontra outras pessoas, sejam anônimas, sejam celebridades, que também forma vítimas desse tipo de discurso.



Um dos casos mais emblemáticos é da jovem Marlard, que, viciada em games e toda a cultura geek, de uma forma geral, viu sua vida virar do avesso quando publicou um artigo a respeito do machismo no mundo dos videogames, criticando o sexismo, a violência misógina e a dificuldade das mulheres serem aceitas nesse meio. Houveram respostas positivas ao texto dela, mas, as reações negativas não poderiam ter sido mais estúpidas: "Vamos enfiar um pepino na bunda dela!", "Por mim, essas vadias já teriam sido esterilizadas!", "Feministas idiotas. Sempre acham defeito nas coisas!", "É solteira, lésbica e feia, mas, não precisa encher o nosso saco!", "Vou comer a bunda dela com uma furadeira!"

Para o sociólogo e especialista em Internet, Dominique Cardon, também entrevistado nesse documentário, "o que aconteceu com a Internet foi que modificamos as regras de expressão pública, autorizamos o relaxamento delas e permitimos o anonimato, que é uma das condições da desinibição das pessoas. Isso permite que elas se aproveitem do véu do anonimato para dizer xingamentos, frases racistas, antissemitas e delirantes de todo o tipo". Marlard também diz o seguinte: "É difícil explicar pra quem não vivei isso. Como é permanente e massivo. Sempre de pessoas diferentes. Parece um jogo, mas, o objetivo é calar você."



O documentário também aproveita a oportunidade para expôr como as autoridades de lá estão reagindo a essa questão, mostrando uma agência do governo francês que investiga esses casos, e também como alguns setores da mídia estão combatendo o discurso de ódio que, quase sempre, aparece em suas plataformas virtuais. Outro caso de destaque de ódio na Internet retratado aqui é o que sofreu Claude Mathieu, que cuida de um filho com necessidades especiais, e resolveu publicar seu dia a dia nas redes sociais. Não demorou muito para que Mathieu recebesse mensagens absurdas, como: "Tudo o que é raro é caro. Vocês têm sorte. Ele deve valer uma fortuna em sites pedófilos!", "Quero que ele morra! A mãe é árabe, o pai é gordo e ele é deficiente. A temporada de caça ao lixo da sociedade está aberta!", e por aí vai.

Bom lembrar que, até pela França ter enfrentado protestos a respeito de imigrações recentes no país por parte de setores da extrema-direita, muito desse discurso de ódio tem como base a xenofobia. E, não à toa, de acordo com dados levantados pela equipe do documentário, os franceses respondem por 87% das reclamações desse tipo de crime do Twitter, sendo que o país possui menos de 1% da população mundial. Cabe, portanto, aprofundar-se melhor se, na verdade, a França é a nação que mais sofre com esse tipo de ataque, ou se é a população que é mais consciente, e denuncia mais, mesmo não obtendo os resultados desejados.



E, falando em resultado, ao final do documentário, Rakhaya, finalmente, encontra alguma forma de justiça, mas, reconhece que é uma privilegiada nesse sistema e que a justiça, realmente, não atingirá a todos. Questiona, pertinentemente, o que é ideal para impedir tanto ódio disseminado na Internet. Reconhece, por exemplo, que só proibir essas mensagens na Rede não adianta. É, então, que vem talvez aquela que seja a resposta mais adequada, de um dos entrevistados: "Acho que precisamos usar de forma mais razoável as vias legais. Não é só nos tribunais e nas prisões que podemos combater o ódio e a intolerância. O verdadeiro trabalho é exercer a pedagogia, explicar, lembrar a História, É pelo discurso que podemos mudar mentes."

Filme completo no YouTube:




NOTA: 8/10

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