Debate Sócio-Político

Reafirmando Valores e Revendo Atitudes
Por Erick Silva


Antes de começar, alguns ponto a se esclarecer.

Primeiro, foi golpe, sim. Nada de verdadeiramente grave foi comprovado a respeito de Dilma Roussef que justificasse, constitucionalmente, seu impeachment. As divergências incluem até mesmo renomados juristas, que viram em todo o processo mais um revanchismo político, de setores que não conseguiram privilégios no governo Dilma, do que algo minimamente amparado por lei.

Segundo, o governo Dilma, até aqui, era muito ruim, mas, não tão ruim quanto os de FHC e de Lula. Mesmo assim, não dá pra negar o mandato da petista foi um grande acúmulo de erros, com poucos acertos. Da realização mambembe da Copa do Mundo até a dificuldade de diálogo com a sociedade civil, passando por retrocessos em setores sociais, que envolvem questões como a da mulher, do negro e do LGBT, a gestão de Dilma deixou a desejar. Não eram motivos legais para a realização do impeachment, mas, com certeza, esses problemas foram bastante prejudiciais a curto prazo.


E, terceiro, as atuais manifestações em favor do impeachment são calcadas na hipocrisia, não adianta choro, nem vela. A desculpa sempre era o "combate à roubalheira de Brasília". Mas, como pensar que se trata da corrupção, se víamos, em peso, cartazes xingando Dilma na sua condição de mulher, pedindo a volta da Ditadura Militar, pregando jargões reacionários, como "bandido bom é bandido morto", etc, etc, etc? Sem contar que, nos últimos meses, tivemos um sem-números de denúncias a outras figurinhas carimbadas da política nacional, como José Serra, Eduardo Cunha, Renan Calheiros e Michel Temer, mas, o foco era sempre contra Dilma. Hipocrisia, pois.

Bem, dito isto, e após o famigerado impeachment ter se concretizado, a ala mais progressista precisa parar e reafirmar seus valores e, principalmente, repensar suas atitudes. De um modo geral, o que há nesse meio é muita arrogância, o que faz com que os mesmos erros sejam cometidos constantemente. E, um desses erros é o não-diálogo com a população em geral. Algo que nem passa perto dos setores mais reacionários, que, independente dos valores que pregam, conseguem manter o diálogo com a sociedade. É algo simplório e cheio de frases de efeito e jargões, porém, a população se identifica e adere em massa a ideias retrógradas.O que precisamos é, portanto, descermos do pedestal, e falarmos com as pessoas de maneira mais simples, deixando o ego de lado.


Outra coisa bem importante que precisa fazer parte dos debates mais progressistas é se, de fato, temos uma democracia. Foram muitas as manifestações de quem a nossa democracia estava condenada, mas, pra falar a verdade, ela sempre esteve. Em mais de um século de República, apenas 4 presidentes eleitos por voto popular terminaram seus respectivos mandatos. Isso, numa "democracia", não se justifica. Ao contrário: mostra que estamos bem mais perto de uma oligarquia, do que de algum regime mais ou menos democrático.  Essa concepção, claro, é dura e resvala na vaidade de muita gente, mas, esse choque de realidade precisa existir para que tenhamos uma noção exata do que estamos lidando: o Brasil não é um país democrático.

É bom esclarecer também que a população brasileira é retrógrada. Não tem jeito, é preciso admitir: somos reacionários, machistas, racistas, homofóbicos, fundamentalistas religiosos e preconceituosos de todo tipo. Nesse caso, a tarefa dos setores progressistas é ainda mais complexa, pois, diante desse quadro, precisa mostrar e explicar a uma população que esse tipo de comportamento é inapropriado e não condiz com a vida em uma sociedade múltipla. Mas, o que vemos por aí é justamente um embate violento, entre ambos os lados, geralmente, composto de agressões e xingamentos, e não de diálogo. Talvez tal reação seja pelo espanto de descobrirmos que somos MUITO reacionários. Ter essa consciência, a priori, já ajudaria bastante.


Ressalte-se que seria preciso repensar o próprio conceito de política. Nesse momento, há muitos que se identificam com ideias progressistas indo para o campo político, propriamente dito, candidatando-se a cargos, como vereador, por exemplo. Mas, será que isso ajuda? Esse impeachment de Dilma provou que não. Mesmo com parlamentares aguerridos, como Jean Wyllys e Jandira Feghali, o Congresso Nacional, em peso, é um antro de velhas raposas. E, são esses verdadeiros "matusaléns da política" que mandam e desmandam nas principais decisões políticas. A própria Dilma Roussef, em muitos momentos, cedeu a essas raposas, não passando inúmeros projetos de cunho progressista, justamente porque iam de encontro aos valores da "tradicional família brasileira". Portanto, não há boas perspectivas em estar do "lado de dentro", pois, mesmo que uma boa resistência, quem toma mesmo as decisões são as piores figuras públicas que poderíamos ter.

Na realidade, com o impeachment ainda fresco em nossa memória, muito ainda vaio ser dito, absurdos serão falados e cometidos aos montes, e claro, sempre estaremos à espera dos próximos acontecimentos. Mas, mesmo com tudo ainda muito recente, todo esse processo, de alguma maneira, é positivo. Mostra que os setores mais ligados à esquerda e ao progressismo veem errando (muito), seja na aliança para tentar conseguirem o mínimo de direitos, seja no próprio trato com a população, cuja a Direita consegue fácil com o seu carisma. São tempos difíceis, sim, e também são tempos de refletir bem, e agir conforme essa reflexão. De certa maneira, foi um balde de água fria que estávamos precisando.

Caminhemos.


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